Já houve um tempo em que o Flamengo fugia de seus compromissos financeiros feito o diabo da cruz. Isso valia, também e obviamente, para o elenco do futebol profissional, a ponto de um meio-campista mediano e metido a engraçadinho ter feito fama por uma infeliz declaração: “Eles fingem que me pagam, eu finjo que jogo”.
Felizmente isso é passado e, ao que tudo indica, não tem mais espaço no clube. Entretanto, mesmo com nossos jogadores pagos em dia – e, diga-se, muito bem pagos –, percebe-se essa intrigante diferença, dentro de campo, entre o Flamengo e seus adversários: a entrega. Em nossas três últimas partidas enfrentamos times que pareciam dar a vida pelo resultado, enquanto passávamos a impressão de estar com uma toalha quadriculada numa das mãos e uma cestinha de vime na outra, prontos para um agradável piquenique ao entardecer.
Por que o Flamengo faz um a zero e nós, torcedores, ficamos com a sensação de que aquela vantagem é efêmera? Por que, quando a situação é inversa e estamos perdendo por um gol de diferença, não sentimos firmeza de que será possível empatar e virar? Por que, ao contrário do que fizeram com a gente o Atlético Mineiro, o Corinthians e o Coritiba, não aproveitamos o fato de sair na frente para matar o jogo? No lugar disso, preferimos os lençoizinhos infrutíferos e as canetas desnecessárias, deixamos de jogar futebol e passamos a bailar. E tome fumo.
Eu poderia falar sobre as sucessivas falhas individuais que causaram o primeiro gol do Vasco. Uma bola que estava nas mãos de Paulo Victor, e César Martins tirou com uma esdrúxula cabeçada para o alto; na sequência, Paulinho deixando a bola quicar três vezes na frente da área, em vez de isolá-la para qualquer lugar; a falta tola, como estamos cansados de cometer em todos os nossos jogos, de Emerson em Andrezinho; o salto ligeiramente atrasado de Paulo Victor. É muito erro para um lance só.
Eu poderia falar sobre o pênalti de Jorge. Não sei se vocês têm o mesmo sentimento que eu: apesar de apaixonado por futebol, volta e meia algumas coisas me desencantam de tal forma que dá vontade de pendurar as chuteiras. O critério de arbitragem cheio de mimimi que, feito jabuticaba, só existia no Brasil. (Ainda falta coisa, mas ao menos isso melhorou um pouco.) A ridícula malandragem do fair play. A cultura da simulação. E a última das tristes novidades, capaz de pôr em xeque o imenso amor de mais de meio século e de justificar que se mande o futebol às favas – como se ele fosse a democracia nos tempos do ministro Jarbas Passarinho –, é essa absurda marcação de pênaltis em lances involuntários.
No post da semana passada citei Neném Prancha, e hoje recorro novamente ao filósofo da Praia de Copacabana. Numa de suas frases mais conhecidas, ele afirmava que “pênalti é tão importante que devia ser batido pelo presidente do clube”. Sim, pênalti é tão importante, mas tão importante, que só deveria ser marcado nos lances em que houvesse a intenção de fazê-lo.
Ah, mas como saber exatamente qual a intenção de um jogador? Que bobagem. Qualquer um que tenha pisado num campinho de pelada em algum momento da vida tem condições de discernir quando ela existe ou não. Juiz de futebol que não consegue avaliar isso não pode ser juiz de futebol.
Como não gosto de usar meus textos aqui no RP&A para discutir arbitragem – prefiro deixar o tema para o pessoal que aparece na caixa de comentários –, sigo em frente. Mas que essa invencionice está insuportável, está.
Retomando. Mais importante do que a sequência de falhas individuais no primeiro gol, ou o falso pênalti no segundo, é a pergunta que dá título ao post.
Mesmo ciente de que esse é um campeonato em que se sobe e se desce sem explicações lógicas ou convincentes, pergunto: qual é o verdadeiro Flamengo? O que engatou seis vitórias consecutivas, mostrando equilíbrio tático e controle emocional, ou o que voltou a ser um bando desorientado em vários momentos das três últimas partidas?
Em termos individuais, o que justifica a abulia de Marcelo Cirino, a vacabrabice de César Martins sempre que o jogo passa por momentos complicados, a deslocada frieza de Canteros, a queda de produção de Alan Patrick, o fato de Jorge e Paulinho acharem que são craques?
Há duas coisas nas quais insisto aqui quase semanalmente. Uma delas é a necessidade de, por não termos um elenco recheado de craques, encontrar um jeito de atuar que se sustente no jogo coletivo. A outra é a obrigação, agravada justamente por não dispormos de uma pletora de virtuoses, de estar sempre em nosso limite. Isso não acontece e é o que mais aborrece, sobretudo porque é o que vemos em adversários mais fracos do que nós – como o Coritiba, como o Vasco.
Quando o Flamengo venceu os seis jogos seguidos, boa parte dos torcedores e dos jornalistas especializados atribuiu o feito à saída de Cristóvão e à chegada de Oswaldo de Oliveira. Como sou cético em relação a milagres operados por treinadores de futebol, sempre vi isso com um olho no padre e outro na missa. De qualquer modo, e já que o procurador-geral Rodrigo Janot garante que pau que dá em Chico dá em Francisco, se Oswaldo colheu os louros por aquelas seis vitórias, ele agora precisa explicar o porquê das três derrotas – e da apatia, e do descontrole, e da falta de organização, e da perda de confiança.
Pensando bem, precisa explicar nada não. O que precisa é fazer o time voltar a ganhar. Só isso.
Muito interessante o assunto. Mas meu problema são essas dores. Quando enfrentei uma crise de dor lombar, o médico me falou desse colchão magnético . Alguém daqui já usou? Falaram que ajuda até estresse.