Que jogo! Que jogo! Enfim, um Flamengo x Vasco digno da tradição do duelo. Fazia algum tempo que não rolava um jogo do Flamengo sem aquela sutil morrinha de cumprimento de tabela. Em muitos momentos da partida tivemos a nítida impressão de que aquele jogo valia alguma coisa. Para os rubro-negros foi um resultado amargo, frustrante. Principalmente aqueles de visão mais ampla, que prestam atenção ao Big Picture, se concentrando na floresta e não na árvore.
Realmente, se o Flamengo conquistasse os três pontos que os sensatos, os práticos e os objetivos já consideravam ganhos, por serem de praxe, o caminho até o Hepta seria ainda mais encurtado. Só que os sensatos têm o péssimo hábito de não combinar nada com os russos. Nem com os alemão.
Cada jogo é um jogo e, mesmo em campeonatos por pontos corridos, os jogos merecem ser apreciados também pelo seu valor absoluto, desconectados de tabelas ou classificações. O Flamengo x Vice da 34ª rodada foi um espetacular jogo de futebol, com tudo que o violento esporte bretão guarda de mais essencial, primitivo e encantador.
Logo de cara, aos 38 segundos, após uma jogada celestial de Reinier, um gol relâmpago de Everton Ribeiro que serviu como uma superdose de Lexotan, tanto pros torcedores quanto pros jogadores. Chapados pelo efeito ansiolítico e hipnótico daquele gol de PlayStation, 99% dos grupos citados começaram imediatamente a fazer o que era mais natural no momento, isto é, pensar no Flamengo x River.
Com a cabeça em Lima, o Flamengo em vez de partir pra cima da baranga e destroça-la categoricamente refreou seu ímpeto inicial e começou a dar mole. Levou uma improbabilíssima virada que, se mantida, poderia ter sido a bancarrota de vários bookmakers. Mas mesmo à meia-bomba foi capaz de buscar o empate. Aliás, o Flamengo empatou com requintes de crueldade, marcando o segundo gol no último segundo do primeiro tempo. Imprimindo instantaneamente nas faces vascaínas aquela carinha de cu tão característica. Uma delícia.
Assim que os times saíram de campo imaginava-se que Jorge Jesus protagonizaria nos vestiários a mãe de todos os seus esporros, aos quais atribuímos extraordinários poderes curativos. Enquanto se compadecia do destino dos nossos craques trancados no vestiário com um Jesus iracundo, a torcida evitava enfrentar o seu medo mais ancestral e reptiliano.
O medo da Flamengada, evento catastrófico e cortador de onda que costuma ocorrer justamente no sexagenário gramado do Maracanã em jornadas em que o Flamengo entra em campo amaldiçoado pelo favoritismo inconteste. Os temores coletivos envolvendo entidades como fantasmas e capetas é um fenômeno cultural universal que mantemos desde a pré-história. Por trás das camadas de alegria e entusiasmo de todo flamenguista eufórico com uma boa fase existe um ser humano assustado, consciente do seu pequeno tamanho diante das forças conhecidas e desconhecidas deste e de outros mundos.
A Magnética tem uma profunda noção do transcendental, do sobrenatural e do espiritual. Tem consciência que o Fantasma da Flamengada está sempre à espreita. É um espírito vingativo, de baixas vibrações, que precisa ser constantemente apaziguado com oferendas de comida, bebida, cânticos e sacrifícios. E vitórias, que são o único contrafeitiço capaz de expulsa-lo de volta para a sua dimensão de trevas.
A Flamengada é como um tsunami, um meteoro enlouquecido, um terremoto não previsto, uma erupção vulcânica não planejada. Não se pode determinar quando, mas é certo que, mais cedo ou mais tarde, ocorrerão. Estamos familiarizados com sua infrequência e sabemos que, dependendo do momento e do contexto, elas podem ser até benéficas.
Naquele preciso instante, o intervalo com o inacreditável 2 x 2 no placar, era impossível não conjecturar. O ideal é que não dê merda, mas se for pra dar merda, é melhor que seja contra vasca do que contra o River. Foi com esse espírito que recebemos o time de volta ao gramado. Escorados na fé de que o esporro de Jesus tem poder esperávamos por uma rápida reação do Flamengo.
Mas foram os caras que fizeram o terceiro gol. Incrível, o Fantasma não ia embora, é hoje que a gente morre. E lá foi o Flamengo mais uma vez correr atrás do preju. As jogadinhas não estavam saindo, nossos craques erravam muito mais do que o normal. Mas num bola-bola lá com Bruno Henrique na quinta marcha saiu o nosso empate. Logo depois Vitinho fez jogada sensacional pela direita e Bruno Henrique, sempre letal, virou o placar a nosso favor. Festa na favela, Baile da Gaiola, poeira, poeira, Oba-Oba correndo solto sem coleira. Voltamos todos a pensar no River.
Deixa perfeita pra reentrada final do Fantasma fela da mãe que faz Diego Alves frangar e o Flamengo tomar o inacreditável quarto gol do Vasco em um mesmo jogo, fenômeno que não ocorria há mais de 22 anos. Estava assim configurada a Flamengada, não havia mais nada que pudesse ser feito. O Fantasma cobrou seu tributo, o sacrifício de uma vitória meio que obrigatória sobre a baranga de fé. Se esse foi o preço pra sossegar esse espírito maligno por um ou dois meses fizemos uma excelente barganha.
Fora o resultado anômalo, foi um grande espetáculo, um verdadeiro clássico, um banquete sensorial com generoso cardápio das mais vastas emoções. Uma das coisas mais legais do jogo foi que os oito gols puderam ser comemorados e lamentados na hora em que aconteceram, em tempo real. Não precisaram de confirmação do VAR. Um luxo raro nesses tempos em que até o grito de gol tem que ficar entalado nas gargantas.
O torcedor da vasca há de estar orgulhoso pra cacete. Não pelo empate com o melhor time do campeonato, que pra quem tá ainda perto demais da confusão um mísero ponto é de pouca serventia. Mas porque é muito legal quando a camisa do nosso time anula diferenças técnicas e conquista um resultado. Inegável que isso os filhos da bigoda conseguiram.
Hoje estamos ricos, mas lembramos bem do tempo da miséria. Quantas e quantas vezes os rubro-negros sentiram o mesmo orgulho naqueles anos de chumbo do Menguinho Pocotó. Ganhamos muitos jogos, e alguns campeonatos, só no peso atômico do Manto. Jogadores vão e vem, timaços se formam e se desmancham, a camisa fica. A camisa é tudo, é ela que nos define como torcedores.
São em jogos como esse, em que as camisas quase jogam sozinhas, que o futebol mostra o que tem de mais grandioso e enternecedor. A porradaria primitiva no final, com o kisuco fervendo por motivo torpe e injustificado, foi o fecho perfeito para um jogo que deveria servir de parâmetro, em termos de emoção e competitividade, para todos os Flamengo x Vasco do futuro. Mas tá tranquilo, sabemos que isso não vai acontecer. Sem o Fantasma nos atazanando, no próximo encontro vamos chacoalhar a baranga como de hábito.
O Flamengo claudicou, mas segue rumo ao Hepta sem nenhuma ameaça aparente. O empate foi uma dose de vacina anti Oba-Oba um pouco exagerada. E tardia. Não faz o menor sentido que a impessoal voz da razão esteja acacianamente recomendando que a torcida segure a onda. Se no domingo já não estava segurando com 10 pontos na frente por que iria segurar a onda agora que a vantagem aumentou pra 11? Seria como pedir pra colocar a pasta de dente de volta no tubo. Não vai rolar.
Esqueceram que o flamenguista não tem medo de morrer? Aqui não tem fartura, mas também não tem miséria. O Oba-Oba já tá solto pelas ruas, correndo atrás dos carros, derrubando latas de lixo e mordendo a perna dos carne ruim. A torcida sabe o que faz. E sabe que a frase do dia, da semana, do ano e do século é: Ainda Não Ganhamos Nada. Mas sempre ligada no advérbio.
Mengão Sempre
Texto fera Arthur. Demais.
Em minha humilde opinião de torcedor de Sofá-Led, só deixo duas importantes dica para o Jorge Jesus: descansa todos os titulares no domingo e muita, mas muita malandragem na Final da Libertadores. Toda malícia contra os anti-éticos e sarados argentinos é pouca.
Como há vários comentários considerando frango o quarto gol vascaíno, vou sair (não do gol), mais uma vez, em defesa do Diego Alves, que poderia ter defendido a bola, sem que, no entanto, se pudesse falar em frango.
Pelo menos na minha época de Maracanã, semanalmente, frango era falhar clamorosamente, bem diferente de uma bola em que existisse a possibilidade de defesa, como aconteceu ontem.
Bola na pequena área é do goleiro, uma máxima do futebol.
Até aí, tudo bem. Deveria ser, portanto, do Diego Alves.
Recordemos o lance.
Falta do excelente Arrascaeta, por sinal desnecessária, próximo à lateral esquerda de nossa defesa, onde, ontem, Filipe Luís deixou a todos, por incrível que possa parecer, com saudades do René.
Cobrada para o interior da área, Diego Alves saiu mutíssimo bem da meta e socou a bola para bem longe, além da nossa intermediária.
Aí está um detalhe fundamental, que vou repetir – saiu muitíssimo bem da meta.
Se saiu, teria obviamente que voltar, numa área super congestionada.
A bola caiu, como não poderia deixar de ser, com jogadores do Vasco, eis que os nossos estavam TODOS recuados.
A deu para B que mandou a bola novamente para o interior da área.
Neste momento, obrigatoriamente, Diego Alves estava recuando.
Apesar de tantos jogadores rubro-negros na área, a bola foi cabeceada pelo zagueiro vascaíno Henriquez, um pouco para frente e para a esquerda.
Novamente os nossos defensores falharam, MUITO MAIS que o goleiro, permitindo que o Ribamar metesse a cabeça na bola, sem a menor oportunidade de perder o gol.
Diego Alves chegou tarde, é verdade inquestionável, não dificultando a ação do atacante rival.
Poderia ter chegado na frente deste, há que se indagar.
Poderia, sim, mas era tarefa bem difícil pelo que acabo de explicar.
Percebo que há, não consigo descobrir o motivo, uma terrível implicância com o Diego Alves.
Muitos estavam loucos que acontecesse uma jogada como a do minuto final de ontem, para que, até em júbilo, pudessem dizer – ^bem que avisei. Este goleiro não é de confiança^.
Da minha parte, não tenho a menor dúvida.
NÃO FOI FRANGO.
Chateadas SRN
FLAMENGO SEMPRE
Carlos, não foi frango. Uma falha de posicionamento. Nessa reta final de Brasileirão e do esperado jogo da final da Libertadores, torço para que todo o sistema defensivo tenha um ótimo desempenho.
SRN
Sim, mas mesmo a falha de posicionamento foi motivada pela primeira e correta saída do gol, quando conseguiu mandar a bola para bem longe da nossa área.
SRN