[ Por Raul Plassmann * ]

Naquele período mágico de 35 dias, fizemos o jogo da vingança contra o Botafogo e devolvemos a histórica goleada de 6 a 0, conquistamos a Libertadores da América, em verdadeiras batalhas campais contra o Cobreloa, e um Campeonato Carioca antológico em três jogos inesquecíveis diante do Vasco. Momentos que não saem da cabeça de nenhum rubro-negro que tenha vivenciado ou não aquele ano mágico de 1981. 

Resolvi então, dentro dos limites impostos pelos tempos de pandemia, procurar maneiras de me reconectar com as pessoas, ciente da dificuldade em encontrar meus companheiros de conquista. Aliás, nesses 40 anos, só me recordo de um único encontro com todos eles, há alguns anos, em uma churrascaria no Rio de Janeiro. Encontro esse provocado por nós mesmos. Não há nenhuma queixa ou mágoa aqui. Não é fácil colocar toda essa turma junta. Torço para conseguirmos de novo!

Enfim, decidi fazer minha comemoração solitária. Primeiro, resolvi encomendar uma coleção de camisas amarelas comemorativas. É impressionante como é difícil ver camisas de goleiro à venda! Confesso que me emocionei muito com todas as demonstrações de carinho recebidas.

Sucesso de vendas, inúmeros pedidos de autógrafos, interações com amigos próximos e distantes e tudo isso com direito até a lives em redes sociais, quem diria? Só fui criar uma conta no tal do Instagram no mesmo janeiro de 2021.

Já no segundo semestre, respeitando todos os protocolos de segurança, aceitei o convite de algumas Embaixadas e Consulados rubro-negros espalhados pelo Brasil: Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e onde mais fosse possível ir. Como foi bom trocar experiências, contar histórias e entregar pessoalmente algumas das minhas históricas camisas amarelas. É como se eu estivesse novamente junto dos meus companheiros, revivendo aquelas vitórias. 

Só que faltava ainda alguma coisa. Foi aí que me lembrei do livro escrito pelo Renato Nogueira e lançado em 2001, curiosamente exatos 20 anos após aquele emblemático ano de 1981. Tive então o prazer de me reconectar com ele, que é uma pessoa espetacular: o Renato soube como ninguém dar cores às minhas histórias de vida. Tenho certeza que até o saudoso Sombra adorou o livro! Não lembra do Sombra? Dá uma olhada nas histórias dele no livro…

Tive ainda a alegria de interagir mais uma vez com os amigos que a vida me deu, como o Zico, o Tostão e o Juca Kfouri. Aqui fica meu muito obrigado a eles e a todos aqueles que ajudaram no lançamento desta nova edição. O livro conta algumas das mais importantes passagens da minha vida – sem elas, eu não teria chegado em 1981. Agora sim, estou pronto para comemorar. 

E é importante que o leitor não me entenda mal. Não há nenhuma tristeza com a minha comemoração solitária, muito pelo contrário. No fundo, estou bem acostumado com isso, sempre foi assim para mim e para os goleiros de forma geral.

Na minha carreira, fiquei a maior parte do tempo solitário mesmo, olhando e torcendo pelo bom desenrolar dos acontecimentos, mas sabendo que a qualquer momento eu teria que fazer a diferença. Pior ainda sendo goleiro de um time como aquele do Flamengo: a bola quase nunca estava na minha área, e os meus zagueiros e laterais não eram de ficar lá atrás me fazendo companhia.

Só que, com o passar do tempo, fui percebendo que não estava tão sozinho como eu imaginava. Logo ali atrás de mim, nas arquibancadas, cadeiras e gerais, milhares de pessoas estavam comigo de alguma forma. Seja porque torciam como eu, ou porque, em algum momento, elas sabiam que teriam que fazer a diferença. E não parava por ali, havia outros milhões espalhados pelos quatro cantos com os radinhos colados ao ouvido, vivendo a partida de alguma maneira particular. Ou seja, eu era um solitário mas na verdade nunca estive sozinho. As camisas, as viagens e o livro me ajudaram a entender isso melhor ainda. 

Ao caro leitor, agora sim um pedido final. Ser solitário não é problema, de jeito nenhum, ainda mais na vida de um goleiro. O problema é ser esquecido. As regras do futebol são centenárias e conhecidas por todos. Não há dúvida que cada equipe pode começar a partida com 11 jogadores. Eu disse 11 e não dez. Logo, as famosas disposições táticas das equipes (4-3-3, 3-5-2, 4-4-2 e por aí vai) pecam no mais básico conceito do futebol: falta um jogador. Onde está o goleiro? Por acaso, ele tem importância menor no jogo? O meu pedido é simples: nunca esqueçam que todo time possui 11 jogadores, mesmo que um deles jogue a maior parte do tempo de forma solitária.

Ainda mais se ele for campeão do mundo.