A história mostra que os Fla-Flus são como Las Vegas ou as surubas da firma, o que acontece no Fla-Flu fica no Fla-Flu. Os Fla-Flus, que por questão de uns poucos dias não figuraram no Genesis, carregam em si tamanha historicidade que os seus 90 minutos regulamentares, fora os acréscimos, se bastam.

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Nos Fla-Flus costuma fazer pouca, quase nenhuma, diferença quais dos times é melhor ou pior. O Fla-Flu é regido por leis próprias de um universo particular. É um jogo de tal maneira impregnado de simbolismos, subtextos e significados que as estatísticas, os momentos dos times ou as diferenças, sejam elas táticas, físicas ou morais, se anulam.

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Ao soar o apito inicial de um Fla-Flu os 22 jogadores que se alinham para o confronto são apenas duas patotas de 11 unidas pelo singelo objetivo de aniquilar a outra patota. Não interessa se o tricolor está à beira da miséria, desclassificado de todas as competições continentais possíveis e com os cobradores a espancar os portões de Álvaro Chaves atrás de suas merrecas.

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Assim como não interessa para o desfecho do Fla-Flu #439 que o Flamengo, com a saúde financeira de um touro de Wall Street na sombra, bafejado pela boa fortuna em um sorteio que o premiou com um caminho suave onde só enfrentará fregueses rumo a que será a terceira final de Libertadores em quatro anos, esteja muito puto com as recentes ousadias do timinho de Laranjeiras. Não há favoritos.

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Para o tricolor, eliminado vergonhosamente das Série A e B continental na mesma temporada e em eterna dívida com a sociedade brasileira, vencer o Fla-Flu é a única esperança de manter alguma sobrevida pelos sete longos meses até o fim do ano. Para o Flamengo, em especial para o ainda balouçante Paulo Sousa, não vencer o Fla-Flu seria catastrófico e, segundo acórdãos do TST, motivo de justa causa para decapitação imediata, respeitando-se os princípios da oralidade, imediatidade e informalidade que regem o Direito Processual do Trabalho.

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Ou seja, tá ruim pra todo mundo, não tá fácil pra ninguém. Como o perrengue é geral, a vantagem, e que cá os alemão não nos ouçam, acaba sendo do Flamengo. E essa vantagem é comparativa. Pelo menos na área do perrengue aqueles que são capazes de decidir essa bronca, os torcedores bem vestidos e indomáveis, estão muito bem preparados.

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Mais de 98% dos atuais torcedores do Flamengo foram concebidos ou forjados em condições extremamente desfavoráveis, bebendo leite C e água da torneira, incentivando pernas-de-pau, comemorando carioquinhas e tá tudo certo. A dieta de filé das temporadas recentes não apagou os ensinamentos adquiridos em anos roendo osso. Não é a soberba, a arrogância justificada ou outra qualidade inerente às massas rubro-negras que fazem da vitória do Flamengo nesse domingo uma obrigação. É a vergonha na cara, só isso.  

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Filósofos, psicólogos, coaches e conselheiros sentimentais concordam em um ponto: a pior mentira é aquela que contamos para nós mesmos. Nesse campo específico do autoengano a torcida do Flamengo bota muita fé na bela teoria de que esse time do Flamengo, ainda sob os efeitos psicotrópicos da lisérgica temporada de 2019, só se anima a jogar bola quando tem diante de si adversários de real valor.

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Os rendez-vous com timinhos como Fluminense, cuja ocorrência é majoritária no calendário nacional do Flamengo, entediam e aborrecem nossos exigentes craques, que só estariam dispostos a soltar suas milionárias pregas quando existe genuíno desafio esportivo. Para os rubro-negros mais céticos (são poucos, mas existem) soa hiperbólico falar em desafio esportivo antes de um enfrentamento com um adversário foragido das divisões subalternas e homiziado na Série A de forma precária.

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É aí que a vergonha na cara supracitada, exerce sua influência. Quando o Flamengo enfrenta os réprobos tricolores o desafio deixa a esfera esportiva e adentra o campo da moral. Por isso os efeitos das vitórias do Flamengo no clássico interdivisional não ficam restritos às páginas esportivas, seus reflexos estendem-se à sociedade brasileira, que aceita de bom grado qualquer reforço ao lado certo na sua eterna luta contra o dragão da maldade.

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Pro Flamengo esse Fla-Flu pode ser o início, o fim ou o meio. Mas não há alternativa, tem que ganhar desses cara de qualquer jeito. Se não ganhar o bagulho vai ficar neurótico. Tem que ser herói. Tem que ser Flamengo.

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Mengão Sempre

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