Até quem não teve o prazer de ler o parrudo Moby Dick do Melville sabe do que se trata. É a história da obsessão de Ahab, o velho e noiado capitão da baleeira Pequod, em caçar e se vingar de Moby Dick, um furioso cachalote branco, “o maior animal do globo; a mais formidável, para enfrentar, de todas as baleias” que arrancara sua perna em entrevero anterior.
Recomendo fortemente a leitura atenta do romance, que quando saiu em 1851 foi um estrondoso fracasso de vendas e de crítica e levou alguns bons anos até ser considerado um dos maiores romances da língua inglesa. Mas pra quem não for ler mesmo lanço o último spoiler: Moby Dick é uma baleia braba.
Hoje, o Flamengo é o Moby Dick do futebol brasileiro, caçado por dúzias de capitães Ahab, todos manquitolando em seu encalço, dispostos a tudo para se vingarem de sacodes impostos pelo fuderoso equalizador da Gávea em 2019. Os cara do Palmeiras, grandes desportistas, em conluio deslavado com a CBF, tentaram nos ferrar forçando a barra pra jogar contra os nossos crias enquanto os adultos amargavam o isolamento compulsório dos corongados. Os sem drenagem, que já foram grandes e hoje amargam uma embaraçosa fila de 40 anos sem ganhar Brasileiro, comemoraram um empate maroto em que dois pênaltis claros a favor do Flamengo não foram marcados como se tivessem ganho uma eletrizante final de campeonato gaúcho.
Mesmo caçado, infectado, com metade dos titulares dodói e ainda sacaneado vezes sem fim pela inidônea CBF, valhacouto de picaretas, são paulinos, corintianos e palmeirenses cheios de mágoa, o Moby Dick Flamengo segue espalhando dor e vergonha pelo Brasileiro, arrancando pernas de professores às quartas, quintas, sábados e domingos. Fazendo que a bronca dos nossos Ahabs de chinelo de dedo só aumente.
Bronca do Flamengo não é exatamente um artigo exclusivo da arco-íris, a torcida do Flamengo também é capaz de se emputecer seriamente com o time que tem ganhado tudo que lhe passa na frente com notável regularidade. Domingo, jogando no Maracanã o Flamengo foi atingido pela inescapável maldição da flamengada e sofreu sua mais escrota derrota em território nacional desde os tempos em que o vigarista Paolo Berrero nos extorquia 850 paus todo os meses com promessas jamais cumpridas de acabar com o caô.
A goleada sofrida para o mal ajambrado São Paulo de Diniz, enfureceu a ponderada e fleumática torcida rubro-negra, que anda meio destreinada nessas paradas de Acabou o Amor mas que jamais admitiria levar quatro gols de um time todo troncho que outro dia estava sendo chacoalhado pela potência Mirassol. A corneta tocou alto nas rede sociais, com julgamentos sumários e sentenças rigorosas proferidas sem o exame de provas, mas cheias de convicção. O sistema é bruto.
A goleada em si pode ser explicada facilmente, o Flamengo jogou menos bola que o adversário, que pra complicar uma situação que já era desfavorável, ainda fez gols em número superior aos feitos pelos jogadores rubro-negros. Aí não tem jeito, perde mesmo. Parece óbvio, mas é bom que se explique já que há toda uma novíssima geração de torcedores do Flamengo que, assim como os normandos desconheciam o medo, não faziam ideia de que o Flamengo era capaz de perder.
Bem, agora espero que todos tenham aprendido essa importante lição, que merece ser guardada para a vida: às vezes o Flamengo perde. É um evento raro, mas que numa perspectiva mais abrangente de tempo acontece muito. A derrota, pela invulgar elasticidade do placar, foi mais feia do que propriamente danosa. Ao fim da 19ª rodada do Brasileiro o Flamengo segue líder em pontos, melhor ataque, aproveitamento, etc, etc etc. Só não termina a primeira metade do campeonato na liderança para evitar o embaraçoso mico da Taça Osmar Santos, estupidamente ofertada ao fim do primeiro turno de um campeonato disputado em ida e volta.
É verdade também que o Flamengo só não ocupa o topo da tabela devido ao quesito de desempate saldo de gols, no qual é apenas o terceiro melhor entre os 20 times. Esse bronze no saldo é surpreendente. O Flamengo de 2020 toma gol toda hora, tendo uma das piores defesas do Brasileiro. Tomar gol à pampa nem seria um problema se o ataque do Flamengo não andasse tão muquirana. Infelizmente os atacantes do Flamengo tem se revelado, todos eles, excessivamente humanos e suscetíveis à más fases, contusões e pé torto.
Contra o São Paulo o Flamengo conseguiu combinar essas duas maldições, a de tomar gols e a de não faze-los, em um mesmo intervalo de 90 minutos. Foi um perdeli goli louco. Nessa configuração cachorra o que mais poderia ser obtido pelo Flamengo que não fosse uma derrota escrota? Em tais casos o que o torcedor de verdade do Flamengo tem que fazer é cornetar geral. Claro que a corneta geral, por ser um improviso executado ad libitum e não seguir uma partitura definida, tem muito de ruído e dissonância e muito pouco de harmonia. Nessas horas junta todo mundo, vem o cara que não gosta de 4-3-3, o vândalo anti posicional, hordas de viúvas de português, o clube do vinho e os adoradores do capeta pra tacar pedra no Dome.
Que o catalão, compulsoriamente privado do profundo conhecimento difundido pela Fla-Mureta, merece um incentivo educacional nem se discute. Domènec é bom treinador e gente boa, mas como se diz na Espanha e em suas ex-colônias, pode também ser terco, maniático y cabron (teimoso, maníaco e idiota). E se não fosse mesmo como teria vindo trabalhar num dos países atualmente mais insalubres e perigosos do planeta? Mas é inegável que os resultado que ele vem obtendo com seu futebol feio e treinamentos inortodoxos, realizados na maior parte das vezes em refeitórios, ônibus, salas de embarque e aviões, são bastante satisfatórios.
Tenho conhecimento de que existe uma numerosa galera que não se conforma que o Flamengo, face sua pujante superioridade técnica, financeira e moral, não tenha colocado ao menos uns 20 pontos de vantagem para o segundo colocado nesse campeonato meia-boca sem nenhum time da Champions. Mas esses caras, também conhecidos por sua explicita oposição à adstringência vúlvica, insistem em desconsiderar que o ano de 2020 é atípico, anômalo e amalucado e que as paradas simplesmente não vão rolar normalmente em nenhum campo do conhecimento humano.
O campeonato é fraco mesmo, todos os times tão meio fudidos, jogam sem o apoio de suas torcidas e a sombra da morte paira sobre todos. É estupidez esperar performances irretocáveis de times que não treinam e que quinzenalmente têm suas narinas futucadas profundamente por invasivos cotonetões em busca de infectados pelo covid-19. Já é um extraordinário ato de bravura e desprendimento que os jogadores, que mais do que ninguém dependem da integridade física para exercerem seu ofício, muitos deles milionários com o boi na sombra, se sujeitem a correr os riscos inerentes à participação em eventos onde a aglomeração, o contato físico e o compartilhamento de fluídos e humores não são facultativos.
O Flamengo se esforça, diria que até que se sacrifica, pra colocar alguma emoção nesse Brasileiro tão previsível. Mas o Paraguai que vive no coração do Atlético e do Inter, nossos rivais mais próximos, não deixa. Fla segue mais favorito do que nunca de um campeonato que todo mundo já sabe como vai acabar. O Flamengo ainda está muito longe do resto dos amiguinhos. O fato de o Flamengo ainda não ter colocado os pés no degrau mais alto do pódio é irrelevante, uma mera formalidade que não traz nenhuma vantagem quando realizada fora de hora. Já aprendemos que não é como começa, é como acaba.
Brasileiro tá tranquilo, o lance agora é garantir a vaga nas quartas da CB e da Liberta. Nesses mata-mata o Flamengo não pode nem sonhar em dar os moles que tem dado no Brasileiro. Enquanto isso, deixa os Ahabs tentarem a sorte, o Mengão Moby Dick continua boladão e afundando os barcos desses comédia.
Faltam 10 pontos.
Mengão Sempre
O Flamengo acertou dois coelhos com uma só cajadada: defenestrou Dome e o Inter contratou o Abel.
Não entendo. Pediram tanto a demissão do Dome.
Conseguiram.
Agora reclamam do Ceni.
Quem vcs queriam? O Jurgen Klopp?
Vcs vivem em que mundo?
O mercado aqui é composto por Abelão (recém-contratado pelo líder do campeonato), Luxemburgo, Dorival e outras malas do mesmo nível.
Não sei se notaram, ir à Europa e trazer um treinador de qualidade em 2 dias não é uma tarefa simples.
O trabalho do Dome foi fraco? Sim. Óbvio. Tem algum técnico no mercado brasileiro capaz de fazer melhor? Não.
O Ceni vem com o benefício da dúvida, por ser sangue novo na beira do campo e estar fazendo um bom trabalho num time pequeno. Mas não passa de uma dúvida.
Assim como era com o Dome.
Taça de Bolinhas? Ah, fala sério…
Estamos todos, sem exceção, vivendo um ano atípico.
Fuderosão.
Uma porra de pandemia, que, a não ser para os tresloucados negacionistas (o principal deles acaba de levar um belíssimo ponta-pé na bunda), vem ceifando millhares/milhões de vítimas, nelas incluído … o futebol.
Futebol sem público, parece-me outro esporte.
O grande tesão virou brochura.
Os jogadores, já desgastados pela doença, por muitos contraída, e, como consequência, pelos jogos acumulados, com poucos dias de recuperação, ainda perderam o estímulo dos torcedores, fato agravado pelo som imbecilizado que, através do mundo, resolveram colocar nos estádios.
Não vejo quase ninguém comentar esse dado que se me parece como essencial.
Aqui ou ali, quase de passagem, surge um comentarista esportivo para levantar o tema.
Não sou, evidentemente, o dono da verdade.
Posso estar completamente equivocado.
Sustento, no entanto, o meu ponto de vista.
Li, numa publicação inglesa, uma colocação muito interessante.
Comentava, há cerca de um mês, a enorme quantidade de gols ocorrida nas três primeiras rodadas da Premier League.
Atribuia o fato – apesar de positivo – a uma despreocupação de jogadores e até mesmo de técnicos. com o que pudesse acontecer ao longo das partidas.
Tanto faz como tanto fez.
Não seria uma disputa a sério.
Ainda ontem, por outro lado, após um empate a um, em jogo fraquíssimo, entre os campeões e vices das duas temporadas passadas do Premier League, os dois técnicos mais do que consagrados – Klopp e Guardiola – fizeram ver que o jogo foi efetivamente bem fraco pois os seus jogadores estavam ^on the edge^.
Desgatados pela preocupação com a doença, pelos jogos que passaram a ser excessivamente acavalados, ou seja, cansaço mental e físico.
Tudo isso, no meu entendimento, deveria ser levado em conta.
Não quero defender o Dome – de quem fui dos primeiros a criticar exatamente pela presunção em querer trocar o que vinha dando certo – mas não posso deixar de registrar esse momento anômalo que vivemos, que tem reflexos em todas as áreas, entre elas, obviamente, a prática esportiva em geral.
Não pretendo impor o meu ponto-de-vista, pelo que gostaria de ler as opiniões de todos os demais, não só do nosso Mestre Incomparável, como dos caríssimos colegas de comentáros.
Pandêmicas SRN
FLAMENGO SEMPRE
O senhor só tem opiniões ponderadas e inteligentes mostrando educação e sabedoria. Pegando carona, concordo com tudo e acrescento o óbvio: este ano não vai ser igual aquele que passou.
Saudações reverenciais
PS – Nao tenho a menor ideia do trabalho do Ceni mas as referências são boas e ele tem uma coisa fundamental que o Dome não tinha: sangue nos olhos.
Pois, Carlos, há uma evidente contradição aí nessa história de muitos gols para estádios vazios: se justamente o que empolga mais os torcedores é o gol, por que eles estão aparecendo agora na ausência deles?
Ceni, sei nao. Outro que mal começou. O trabalho no Fortal é bom. E talvez nao tenhamos opçoes. Mas é arriscado de novo.
O do Del Valle? Disse que nao sai antes do final do ano, mas pro Flamengo ???
Aqui não é lugar, nem é o tema. Mas paciência. É aqui que tem flamenguistas de verdade.
Hoje o Flamengo mostrou hoje que não quer ser sério. Gosto do Domecq? Nem um pouco. Prefiro até o Dreher. Estou furioso com as goleadas e a apatia? Pacarái. Mas demitir um técnico com 63% de aproveitamento depois de 3 meses é mandar recado para o mundo que fazemos parte dessa baderna chamada futebol brasileiro,. Mostrar que estamos mesmo é no mesmo patamar, e descendo. Dar razão ao careca espanho que não quis vir do Equador e à pemca de portugas que declinaram também.
Agora, se trouxer o ladrão da taça de bolinhas, cujo nome eu nem escrevo, acabou.
Cancelo ST.
Não assisto jogos pela TV nem nos estádios (quando reabrirem, se eu estiver vivo) por um período de um ano depois dele ir embora
Guardo as quarenta e tantas camisas numa caixa na área de serviço.
Sou capaz de torcer para cair….
Dignidade não se vende nem se arrasta na merda.
Para os infantes, eis a infâmia: https://www.uol.com.br/esporte/futebol/ultimas-noticias/2012/05/04/sao-paulo-devolve-a-taca-das-bolinhas-para-a-caixa-mas-diz-que-continuara-disputa.htm
Pronto.
Dome defenestrado, ainda bem que a casa não chegou aos escombros, com esse elenco do Flamengo qualquer um que vier, desde que não seja o Abelão, serve.
Até quando minha combalida memória chega, nunca vi o Flamengo tomar tantas goleadas em tão curto espaço de tempo, mesmo naqueles tétricos tempos em que andávamos naquela gangorra de sobe e desce à beira do abismo do rebaixamento. Provem o contrário.
A realidade do futebol no Brasil é muito diferente da Europa. No futebol inglês, espanhol, alemão, francês ou italiano temos de 2 a 3 equipes efetivamente disputando o título e o restante com uma diferença abissal compondo a tabela. Então qualquer técnico tem 4 anos se necessário para errar até começar a acertar, com um calendário de jogos muito mais ajustado.
Aqui o nivelamento é muito maior (mesmo que por baixo) com uma densidade de jogos sobre-humana. O técnico precisa sim de tempo para conhecer os jogadores e o clube, mas precisa mostrar evolução a curto prazo. O JJ conseguiu fazer isso e o time foi melhorando a partir de derrotas na Copa do Brasil, no Brasileiro e na Libertadores.
O Domenech infelizmente não deu certo. Não tem intenção de montar um grupo titular e uma zaga principal para dar entrosamento. Comete sucessivos erros na escalação, com jogadores em péssimo estado psicológico e lentos pra correr atrás de jogadores jovens e velozes. Não treina os fundamentos do futebol, deixando as linhas espaçadas, marcação frouxa e saídas de bola pelo meio (nem em pelada fazemos isso). E quando mais o time precisa de criação no meio e poder de finalização, ele tira Everton e Pedro em diversas situações. Escala zagueiro de lateral, volante de ponta-direita e lateral esquerdo na lateral direita.
Erra e persiste no erro. É questionado pela imprensa e responde com deboche. Enquanto os outros treinadores ficam na beirada do campo orientando o posicionamento de seus jogadores, o catalão fica calado de braços cruzados. No máximo solta um “bravo” ou um “borajogá”. Qualquer peladeiro faz melhor.
O outro lado da moeda é a divisão interna na diretoria do Flamengo. De um lado, Braz e Spindel bancando o Domenech. Do outro o BAP e seus seguidores. E o técnico mesmo não vai pedir pra sair porque sabe que a multa rescisória é elevada. Isso sem falar nos interesses do Grupo City que vem lucrando com a molecada da base.
O futebol inglês não fica neste saco.
Tem SEIS equipes que podem ser consideradas grandes – Arsenal, Chelsea, Liverpool, Manchestes City, Manchester United e Tottenham (ordem alfabética) – além de outras intermediárias, como o Leicester, recente campeão e atual líder.
No mais, tudo bem.
Britânicas SRN
FLAMENGO SEMPRE