Que tragédia. Quando o Flamengo claudica nas terras baianas parece que a tristeza é mais doída. Não apenas por ser o Flamengo a maior torcida da Boa Terra, mas, principalmente, porque a Bahia é parte indissociável da história rubro-negra, cumprindo papel decisivo desde a nossa gênese náutica.
Nunca podemos esquecer que não fosse a coragem e a destreza na natação do jovem Joaquim Bahia, que se lançou ao mar sob forte ressaca para buscar salvamento para o náufragos da Pheruza (nossa primeira embarcação) e o Flamengo não teria sequer sido fundado numa mesa do Café Lamas em 17 de novembro de 1895. Valeu, Bahia!
Desde então o Flamengo sempre teve seus baianos presentes nos grandes e nos nem tão grandes momentos do clube. Além dos populares integrantes da vasta família Baiano; Val, Junior, Fabio, Charles e Fernando (Balança o coração da gente), muitos outros luminares da baianidad emprestaram seu talento em defesa do Manto Sagrado. Onça, Toninho, Merica, Edílson, Aldair, Fabão, Bebeto, Liédson, Beijoca, Bobô, Osni, Obina, Nixon e Hernane Brocador, são apenas os que vem no momento à memória. A lista é quase infinita.
A Bahia, até como ente federativo, também está marcada em nossa história. Foi na primitiva encarnação da Fonte Nova, com seus monumentais 80 mil lugares, que Zico marcou seu primeiro gol como profissional do Flamengo, pela segunda rodada do Campeonato Brasileiro de 1971.
Ou seja, com raríssimas exceções, casos de Gabriel, Vampeta e o desse imperdoável jogo pela 13ª rodada do Brasileiro 2019, por exemplo, a Bahia quase que só traz lembranças boas ao Flamengo. O jogo desse domingo é daqueles pra se esquecer completamente, nada prestou.
Dizia Gregório de Matos, baiano, poeta maior do barroco luso-brasileiro:
Triste Bahia, oh, quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado
Aquele time com camisa de treino e nenhuma referencia visual ao nosso rubronegrismo vital não parecia nem de longe o Flamengo. Menos ainda o Flamengo que estávamos aprendendo a ver em campo sob a égide europeia de Jorge Jesus. O Flamengo parecia um bando de cansados, querendo que o mundo se acabasse em barranco pra poder morrer encostado.
É verdade que tem sido virtualmente impossível ao treinador mandar a campo a mesma formação duas vezes seguidas. A saga macabra das contusões segue fazendo vítimas e destroçando qualquer tentativa mais ambiciosa de entrosamento. A defesa jogava junto pela primeira vez e estreando um quase veterano visivelmente fora de forma. Pra compensar desfrutamos da regularidade de Diego Alves, que tem se esforçado pra tomar gol bobo em todos os jogos possíveis.
A boa gestão, o planejamento cientifico, os craques às mancheias, o maldito dinheiro, enfim, de nada nos serve quando não são bem utilizados. Bem poderia ter dito Gregório de Matos, o Boca do Inferno, se o Flamengo fosse assunto em voga no século XVII:
A ti tocou-te a máquina mercante
Quem tua larga barra tem entrado
A mim vem me trocando e tem trocado
Tanto negócio e tanto negociante
Quando o assunto deixa de ser futebol para ser uma questão de dinheiro uma coisa é certa, Mamon não aceita desaforos. Quando os altos poderes do Flamengo se decidiram por jogar pela janela meio ano de trabalho e preparação com uma comissão técnica obsoleta, e formada na base da brodagem, alguém nos recônditos gabinetes deveria ter alertado que, mais cedo ou mais tarde, o custo dessas barbeiragens dos gestores seria obrigatoriamente pago pelo time em campo. E mesmo que esse alguém tenha feito o aviso é óbvio que ninguém prestou atenção. Compreensível, no oba-oba obrigatório pós chegada ao poder quem prestaria atenção a detalhes?
A conta chegou. E mesmo cheio da grana faltou tudo ao Flamengo. Vontade, organização e preparo físico. Os caras correram muito mais que o Flamengo, parecia que nossos craques tinham encarado uma travessa de abarás completos com muita pimenta antes do jogo. O juiz era um salafrário pusilânime que validou o primeiro gol dos caras em impedimento acintoso, mas não dá pra espetar essa derrota na conta do safado. Mesmo porque o Flamengo é roubado clamorosamente em todos os jogos. Juizes desonestos que não cumprem as regras podem até estar nos trend topics nacionais, mas já não nos servem como desculpa.
A torcida que ver o Flamengo, que tem a bolsa forrada e parece poder comprar o que quiser, ganhar tudo. Mas está ciente que não é bem assim que a banda toca. Alguns já perceberam que o Flamengo está começando o trabalho agora, com as competições rolando. Mais de metade do ano já rolou, mas os nossos caríssimos jogadores e prestigiado treinador ainda estão se conhecendo. Repetindo mais uma vez a tradicional rotina rubro-negra de trocar o pneu com o carro andando.
O Flamengo, talvez por superstição, talvez por incapacidade, insiste em fazer tudo ao contrário do que os manuais de boa gestão esportiva recomendam. A esperança só pode estar na ciência, que afirma que a probabilidade de um raio cair duas vezes no mesmo lugar, ao contrário do que diz o senso comum, é enorme. O raio pode até cair de novo no mesmo lugar, mas algo (o calendário gregoriano) nos diz que 2009 foi um só e não se repetirá jamais.
O Flamengo é indiscutivelmente grande. E não é grande porque ganha de todos os outros. O Flamengo é grande porque não desaba inteiro depois de uma derrota inesperada. Perder é do jogo, mas, veja bem, Jesus, perder do Bahia jamais poderá ser normal.
Tristes sucessos, casos lastimosos,
Desgraças nunca vistas, nem faladas.
São, ó Bahia, vésperas choradas
De outros que estão por vir estranhos
Mengão Sempre
Nunes é de Feira de Santana.
Artur,
Acompanho seu trabalho desde a conquista do Brasileiro de 2009 e peço para que não deixe de escrever sobre o Flamengo. Você é disparado o cara que mais entende o lado rubro negro na escrita. Confesso que sinto muito falta dos seus textos, você é exemplar nesse ofício de apaziguar nossas derrotas e ao mesmo tempo fazer rir e apresentar grandes textos cheios de sarcasmos e outras figuras de linguagem. Parabéns hoje e sempre e não se esqueça de se dirigir à nação com suas linhas geniais literárias. Sou teu fã cara e se um dia der certo, pagarei uma cerva com o maior prazer se Brasília for o destino. Forca sempre!
Assino embaixo
SRN
Pagaremos estas cervejas. O Arthur é parte indissociável da alma carioca rubro-negra. Os textos dele são fenomenais e deveriam estar nas bibliotecas de todos os cursos de jornalismo.
a coisa pode piorar…
se trocar pneu com carro andando já é ruim,imagina o poste mijando no cachorro.
SRN !
Copo cheio: Podia ter sido de seis…
Não sei se ainda dá… Acho que deveríamos concentrar mais no brasileiro que na libertadores. O time varia demais… Uma semana pra descansar e recuperar. Semana que vem tem os dois gaúchos no RJ, Gremio e Inter, depois vasco e inter de novo…
Se trocou o pneu com o carro andando é porque a torcida entendia inadmissível perder, fora de casa, para o Inter e para o Galo por exemplo.
Agora toma de 3 para o Bahia, e tem defensor da suicida troca de pneu em movimento dizendo que temos que entender a derrota visto que o Santos também perdeu de goleada para o Ituano etc.
A nenhuma paciência com o pneu anterior e a tolerância de Dalai Lama com o pneu de grife europeia causa espécie.
Não quero o Flamengo jogando com linha alta, média ou baixa. Quero que jogue para VENCER.
Será que é pedir muito?
Artur, para não fugir a baianidade da sua crônica cito aqui um baiano famoso, um certo Ruy Barbosa: ” um sodalício de apedeutas”, que ele certamente definiria o atual bando que constitui o Flamengo, diretoria, comissão técnica, jogadores e que tais, infelizmente, a carapuça já vem cabendo há longos anos.
“O Flamengo parecia um bando de cansados, querendo que o mundo se acabasse em barranco pra poder morrer encostado.”
Gracias, Arthur, por amenizar um pouco do mau humor com que(m) fui dormir e acordar pior ainda.
Quando o Felipe Luís foi anunciado como titular, não gostei, achei precipitado – fora de forma e sem entrosamento.
Já com o Rafinha se dava o oposto: desgastado e, pela idade (embora eu entenda que isso é mais condicionamento mental do que fato físico), deveria ser preservado.
Everton Ribeiro e Arascaeta voltando de contusão deixaram claro estar longe da forma ideal. Não jogaram nada.
Arão emendou o sono do 2º tempo contra o Emelec e até agora não acordou.
Diego Alves não se sentiu à vontade em ser mitado na 4ª e voltou aos velhos e maus tempos do expurgo da torcida.
Piris da Mota mostrou que é o próximo Pará.
E JJ, que alegou desgaste na coletiva pós-jogo, não entendeu pra que serve o tal do elenco. Coisa de português (como dizem meus amigos portugueses em auto-ironia).
Salvaram-se, com média 6, Gérson e Reinier que, se for vendido por menos que o valor da multa – €70 milhões -, merece invasão no CT e sequestro dos dirigentes.
Eu odeio futebol!
srn p&a
Exatamente o que pensei, Rasiko. Não era jogo pro Filipe Luiz ainda, especialmente pelo fato do não termos o Cuellar em campo, o que sobrecarrega demais e zaga. Portanto, bastava manter o Renê, que sempre mantém o ritmo e a pegada em todas as partidas. Aliás, é de tirar o chapéu (na minha opinião) a regularidade do Renê. Sou fã do cara e não nego, podem criticar.
Quanto ao Cuellar, será que a diretoria ainda não percebeu que precisamos de um volante à altura dele no elenco, muito mais do que qualquer outro atacante?
Por fim, quantos frangos e cagadas o Diego Alves precisa fazer pra ser barrado? O Cesar deve se sentir um inútil sendo banco pra esse cara e não ter uma chance sequer. Cadê a porra da meritocracia? Só vale pra jogador de linha?
PS: e mais uma vez o Flamengo consagra um atacante de um time mediano.
SRN.
Gilberto ontem teve dia de João Danado, esquecido na lista aí, Arthur.
Kkkk só uma crônica do Arthur pra fazer rir depois de uma sapatada dessas!
Concordo com usar tudo no texto, como de costume. Porém penso que o problema físico dos nossos jogadores está totalmente relacionado à intertemporada suicida que nossa nova comissão técnica realizou. Olhando as manchetes da época vejo que os jogadores foram submetidos a treinos físicos fora dos padrões a que estão acostumados, saindo sempre exauridos.
Eu não sou preparador físico, mas não parece coincidência que vários jogadores tenham problemas musculares ao mesmo tempo e o time esteja morto em campo.
Nosso treinador parece ser muito bom, mas a preparação física está deixando muito a desejar.
SRN
Leonardo, á apenas uma opinião, mas a culpa maior é da comissão técnica anterior que dava treinos meia-boca. Isso não tira a responsabilidade do JJ que, 1º, deveria ter feito uma mescla de preparadores físicos entre os que estavam com Abel e os seus para que a adaptação fosse passo a passo; e, claro, não poderia, como se pode constatar, entrar de sola como entrou. Arrogância sempre tem um preço alto.
Salário em dia porrada em falta!
Adoro quando os cabeças de planilha colocam um ar de profissionalismo e retidão na atividade mais salafraria desempenha em terras brazucas, a de boleiro.
Eh inconcebível que alguem te a menos de um mês competiu em uma competição internacional e teve mais de duas semanas de trabalho em novo clube se apresente fora de forma como nosso novo lateral. Que até que faça algo pelo Flamengo nada indique que seja melhor que o reserva que também eh um ninguem.
Se na Europa os jogadores tem vergonha na cara por se tratar de um clima de cobrança generalizado aqui na nossa terra parte do clima de cobrança eh feito pela torcida (que anda sumida fora do estádio)
Nada reflete mais displicência que o goleiro entregar uma atuação de várzea e sequer se desculpar com o torcedor.
Penso em como seria a reação se um bando de 50 assalariados contribuissem com parte de seu salário de fome para contratar um prestador de serviço milionário e esse entregasse um serviço que LITERALMENTE qualquer um poderia ter feito.
Se a desculpa eh o excesso de jogos entao claramente os pagamentos estão super inflacionados uma vez que eh totalmente razoável que alguem que ganhe seu rico dinheirinho possa apresentar-se quatro vezes ao mês de forma digna durante 2 horas.
Quando a torcida modinha parar de “consumir” o futebol quem sabe o velho torcedor possa aumentar o fervo dessa panela e assim deixar o almoço pronto.
Eh esperar os come e dorme voltarem para o Rio agora.
Não é nenhuma novidade o comportamento fora dos domínios. Estamos na 13a Rodada e o time não ganhou um jogo sequer em campo adverso. Mais um desempenho ridículo. Longe da torcida e da pressão, há um visível relaxamento, a começar por mais uma atuação sofrível do suspeito goleiro.
Basta uma simples avaliação para perceber que será impossível a conquista de título se não começar a ganhar em terreno inimigo. Desconheço tal feito.
De positivo apenas a regular atuação de Gérson, destoando dos demais e o aprendizado com a derrota. É necessário uma análise mais criteriosa de desempenho e de elenco. Mudanças são necessárias. Começando pela meta.
SRN
Caro Arthur
Perder pro Bahia é foda, mas pense na grandeza e generosidade do Flamengo. Deu mole e fez a alegria de milhões de pessoas. Pro Bahia valeu o Campeonato Brasileiro! Não vai cair, mas ganhou do Flamengo!
Festa e alegria na Bahia. Amanhã todos vão trabalhar felizes e produzir mais, certo? É o Flamengo provando que é uma força incomparável na economia brasileira, pois os ganhos econômicos advindos da felicidade de uma parte dos trabalhadores com nossos infortúnios são enormes, pois um trabalhador feliz produz mais que um infeliz, concorda?
Foda mesmo é ver os baianos correndo pra caralho e indo em cada bola como se fosse a última da vida e os bem de vida flamengos com ar “blasé”. Por outro lado, muita calma nessa hora! Já demos moles piores e superamos. Esqueceu da quarta-feira passada?
Muita água ainda vai rolar, mas esperemos que essa apresentação patética não se repita jamais.
SRN