Não assistir aos jogos do Mengão é, seguramente, umas das situações de maior tensão a qual um rubro-negro pode se sujeitar voluntariamente. E nada mais reconfortante do que constatar ao fim dos 90 minutos do jogo não assistido que o Flamengo já é um homenzinho, capaz de ganhar clássicos (ainda que interdivisionais) sem contar com a nossa atenta supervisão.
E ainda mais importantes que os 3 pontos pela vitória são as fortes suspeitas de que o Flamengo evoluiu. Já combinamos de antemão que este campeonato não vale nada. Porque o real objetivo do carioqueta, com seu regulamento liliputiano e seus pênaltis psicodélicos, se trata muito mais de convencer do que de vencer. Nesse sentido o Flamengo parece estar avançando na direção certa.
Não vi o jogo. Um fenômeno raro, pois há anos venho negligenciando prazos, horários e os mais variados compromissos sociais e profissionais por causa do Mengão. Mas nesse domingo simplesmente não deu pra ficar vendo o Fla-Flu. Então terei que ser breve, pois muito não tenho a dizer.
Enquanto me abrigava da pasteurização do samba no Doce Refúgio da Rua Uranos, mantive um ouvido ligado no que acontecia no Mané Garrincha. Gol de Arão, gol de Guerrero, cenas lamentáveis, as moças descontroladas, as noticias chegavam como bouquet de flores e eram ruidosamente comemoradas pela massa rubro-negra na roda de samba do Cacique de Ramos.
Quando assistimos um jogo ao vivo, o discurso é o dramático. Quando assistimos ao VT já sabendo do resultado do jogo o discurso é do gênero épico. E quando gravamos um jogo e o assistimos tempos depois o discurso passa a ser lírico. Não chego a dizer que o Fla-Flu de ontem seja daqueles que devemos gravar para os pósteros, mas não é difícil encontrar poesia nas ações de nossa formidável rapaziada.
Quando Arão manda o sapato e coloca 1 x 0 no placar, quando Guerrero supera a débil marcação do zagueiro que o Flamengo não quis e mete o nosso segundo gol de cabeça, quando César Martins tem a melhor atuação de sua carreira, quando Cuellar deixa aflorar o guerreiro guarani e aplica violenta reprimenda física aos que os fustigavam, tudo isso é poesia. O Fla-Flu manifesta sua beleza das mais variadas formas. E ninguém precisa ser poeta para admirar a hora em que a porrada estanca no Fla-Flu e o velho debate entre transubstanciação e consubstanciação, que divide rubro-negros e tricolores desde tempos imemoriais, entra em cena. Somos todos da paz, mas quando defendemos nossos dogmas queremos ver sangue.
Isso é o Fla-Flu, senhoras e senhores, o clássico mais yin yang do planeta. O Flamengo está de parabéns, detonou com o flower-power. Desta vez o bem venceu o mal, mas aqui ninguém vai ficar de bobeira. Estamos sabendo que a batalha continua por ser eterna. Parabéns à Magnética brasiliense, que comprovou que é tão rubro-negra quanto qualquer um de nós e sepultou aquele surto de imbecilidade xenofóbica que assolou as mentes mais fracas após o jogo com o Coxa pelo Brasileiro passado. Somos todos iguais, fechados com o certo e muito bem vestidos. O show tem que continuar. Que Deus possa perdoar essas pessoas que não assistiram ao Fla-Flu.
Mengão Sempre
Bem aventurado aquele que não se condena naquilo que aprova.
SRN