Fundada a 15 de novembro do ano da graça de 2021, a Academia Flamenga de Letras não tem como objetivo de modo algum rivalizar com a centenária ABL. Aceitaremos, contudo, todo e qualquer desafio para uma pelada com churrasco contra a turma de Gilberto Gil & cia.
A Academia Flamenga de Letras (AFL) nasce guiada pelos objetivos mais honrosos. A rigor, trata-se de uma resposta necessária a detratores que, séculos a fio, buscaram impingir em nossa torcida a fama de analfabeta. Uma tese cruel e injustificada de que todo e qualquer analfabeto funcional deste país é frameng, flamemg… Bem, vocês entendem.
O objetivo primeiro da instituição, portanto, é o de educar. E comprovar, histórica e literariamente, que a massa rubro-negra constitui maioria em toda e qualquer fatia da nossa população, dos iletrados mais sabidos ao intelectuais mais abestados. Gente, aliás, que costuma se abraçar a cada gol no Maracanã.
Não há, por parte da AFL e seus membros, nenhuma vontade de macaquear a ABL ou a própria Academia Francesa, a que deu origem à versão brasileira (Herbert Richers). Em nossas reuniões, nada de chás com madeleines, por exemplo. No máximo chá de macaco com torresminho, para deleite de nossos bem vestidos imortais.
Do traje: se o Manto Sagrado é nossa segunda pele, não haverá lugar para fardões, veludos, espadas e outros trajes fora de moda. Ao tomar posse, contudo, o novo imortal deverá trajar obrigatoriamente meiões rubro-negros. Caneleiras serão opcionais.
Ainda de acordo com seu estatuto, a Academia Flamenga de Letras prevê que os candidatos precisam amar o Flamengo, saber usar vírgulas e ter obras, em qualquer gênero da literatura escrita, falada, cantada ou assobiada, de mérito reconhecido pelos torcedores.
Caso um notável Acadêmico ou Acadêmica for para outro patamar, sua cadeira será declarada vaga na Sessão da Saudade, e a partir de então os postulantes à vaga terão a possibilidade de lançar sua candidatura, por carta, email ou urubu-correio.
Após a votação, o então Presidente será o responsável por marcar local e data da posse, onde o eleito ou eleita lerá um bonito texto rubro-negro enquanto o povo tentará segurar as lágrimas. Ao novo Acadêmico ou Acadêmica será concedida a opção de pagar uma rodada para todos os presentes. É desonroso e vai contra o espírito que rege a Academia pendurar a dolorosa na conta do acadêmico falecido.
A seguir, todas as 40 cadeiras e patronos da nossa Academia Flamenga de Letras – de A de Ary a Z de Zózimo.
Cadeira nº 1: Ary Barroso (1903–1964)
Pianista e comunicador mineiro, o genial compositor de “Aquarela brasileira” era admirado por Walt Disney e Tom Jobim, e largava a narração no meio para pular em gols do Flamengo. O amor do radialista pelo time o levava a ignorar suas maiores fobias. Em 1943, pediu um avião emprestado ao patrão Assis Chateaubriand e voou, apavorado, para trazer do Paraguai o jovem Modesto Bria, que interessava a outros clubes. Com sua gaitinha e sua verve, ajudou a multiplicar pelas ondas do rádio a imensa torcida flamenga.
(Indicado: João Bosco)
Cadeira nº 2: Almir Guineto (1946–2017)
Filho da mítica dona Fia do Salgueiro, o carioca Almir de Souza Serra foi um dos maiores inovadores do samba brasileiro. Muitas vezes trajado com o Manto Sagrado, esbanjava com seu banjo acoplado a um braço de cavaquinho, instrumento que inventou e adaptou à roda de pagode do Cacique de Ramos. Improvisador de rimas geniais e co-fundador do Fundo de Quintal, Almir “Guineto” (o apelido veio de “Magneto”) compôs algumas joias musicais, como “Lama nas ruas”, com o alvinegro Zeca Pagodinho. Foi parceiro de Mussum a Mano Brown.
(Indicado: Claudio Cruz)
Cadeira nº 3: Alvaro Moreyra (1888–1964)
Um dos cronistas que influenciou Rubem Braga, o gaúcho Alvaro Moreyra foi um célebre e celebrado poeta, repórter, ator e produtor teatral. Seu estilo pode ser saboreado em frases como: “Gosto de todos, mas sou Flamengo. Ser Flamengo é ser eternamente moço, sem geleia real, sem novocaína, pílulas, gotas, poções – na alegria de estar junto do povo, andar feliz com pobres e ricos, com os que possuem o encanto da gente carioca, dizendo as coisas mais sérias com ar de riso, coração aberto, inteligência acesa e tocando para a frente, firme e legal”. E outra: “Uma história de outros tempos conta que o homem feliz não tinha camisa. A história deste tempo conta que o homem feliz tem camisa, e é a camisa do Flamengo.” Foi pai do também craque do jornalismo Sandro Moreyra que, vai entender, virou botafoguense empedernido.
Cadeira nº 4: Antonio Callado (1917–1997)
Escritor niteroiense, Callado jogou nas onze, como repórter, tradutor, romancista, teatrólogo. E ainda cobriu a guerra no Vietnã. Escreveu certa vez: “Sou Flamengo, e, portanto, Zico é meu guru. No campeonato de 1982 o Flamengo só ganhou do Sport Recife, no Maracanã, pelo pálido placar de 2 x 0. Foi vaiado pela galera, que queria uma goleada. Zico, paciente e sábio, declarou: ‘Temos que levar em conta que diante de nós estão 11 jogadores, também dispostos a ganhar’. Era Zico como eco, irmão de Sartre: ‘O inferno são os outros’.”
Cadeira nº 5:
Antônio Candeia Filho (1935–1978)
Compositor, pensador, letrista e cantor, Candeia foi um dos fundadores da Portela e um dos músicos mais influentes do país. Em 43 anos de vida, criou obras-primas da nossa música como o samba-enredo “Seis datas magnas” e as canções “Preciso me encontrar”, “Dia da Graça”, “Expressão do teu olhar”, “De qualquer maneira”, entre tantas. Músico desde garoto, foi capoeirista e policial civil. Até que, aos 30 anos, envolveu-se numa briga de trânsito e levou um tiro na medula espinhal, que o deixou paraplégico. Da sua cadeira de rodas, seu “trono de rei” do samba, Candeia agitou o mundo da música com ideias, escolas de samba inovadoras, rodas de samba e gravações antológicas – e ainda encontrava tempo para torcer para o Flamengo, como testemunhou o talentoso aluno Arlindo Cruz. Seu livro, ”Escola de samba: a árvore que esqueceu a raiz”, é referência até hoje para estudiosos.
(Indicado: Arlindo Cruz)
Cadeira nº 6: Bussunda (1962–2006)
Fundador da Fla-Diretas e da Fla-Geral, Bussunda foi um dos humoristas mais queridos do Brasil. Lançou com a turma do Casseta & Planeta 20 livros, três discos, uma peça de teatro e um filme. Contava que, em Chartres, interior da França, deparou-se com o grafite num muro: “Mengão campeão do mundo”. Morreu na Alemanha após uma pelada sob forte calor, e recebeu a maior das homenagens: teve seu nome, ou apelido, entoado por toda torcida do Flamengo no Maracanã.
Cadeira nº 7:
Carlinhos Niemeyer (1920–1999)
Ex-piloto da FAB nos anos 1940, foi namorado de Carmen Miranda, boêmio e flamengo fanático. Notabilizou-se, contudo, como produtor, documentarista e cineasta. Foi o criador do clássico “Canal 100”, um cinejornal exibido semanalmente nos cinemas, com imagens poéticas captadas por câmeras em todos os cantos do Maracanã. E a música de fundo? Tan-tan-tan… Era o samba “Que bonito é”, de Luiz Bandeira, em versão instrumental de Waldir Calmon e orquestra. Toque de gênio. O “Canal 100” existiu de 1958 até os anos 1980. Carlinhos ainda filmou (a cores!) a Copa de 1970 no México e deixou longas como “Brasil bom de bola” e “Futebol total”.
Cadeira nº 8: Carmen Miranda (1909–1955)
A “Pequena Notável” tornou-se rubro-negra aos 16 anos, quando começou a namorar o remador flamengo Mario Cunha. Nos sete anos em que durou o namoro, até 1932, a ilustre cantora e atriz pôde torcer pelo Flamengo em diversas provas. Segundo o biógrafo Ruy Castro, Carmen era a única ovelha rubro-negra em sua família, toda formada por vascaínos – seu irmão Mocotó era remador do Vasco e da seleção brasileira. Carmen foi com os parentes ver o Flamengo x Vasco decisivo do bi de 1954. Vibrou tanto com o 2 a 1 nas cadeiras especiais que foi cornetada pelo cunhado. Rebateu: “Ih meu filho, Flamengo, Carnaval, samba, é tudo a mesma coisa!”
(Indicado: Ruy Castro)
Cadeira nº 9: Celso Garcia (1929–2008)
Em quase 40 anos de carreira, o paulista Celso Garcia criou bordões, revelou José Carlos Araújo e emocionou a torcida ligada no radinho. Foi locutor, repórter e comentarista. Fez tudo e mais um pouco, mas nem precisava, porque foi o jornalista, morador de Quintino, o responsável por mover mundos e fundos para levar o molecote Zico, seu vizinho, para fazer seu primeiro teste como dente-de-leite na Gávea. “Foi o maior rubro-negro que conheci”, definiu Zico, e isso basta.
(Indicado: Jânio de Freitas)
Cadeira nº 10: Cyro Monteiro (1913–1973)
Vinicius de Moraes o considerava “o maior cantor popular brasileiro de todos os tempos” e ia além: “Cyro, para lá do cantor e do homem excepcional, é um grande abraço em toda a humanidade.” Fanático pelo Flamengo, a ponto de dar mantinhos sagrados para todos os bebês de amigos, Cyro era bondoso a ponto de ficar sinceramente triste quando o Flamengo goleava o time de amigos, como testemunhou Sérgio Cabral. O “Formigão”, como era chamado com carinho, nos deixou antes de Zico se tornar titular, mas já dizia nos intervalos de suas apresentações: “O melhor time do mundo é o Flamengo. O segundo melhor time do mundo são os reservas do Flamengo. E o terceiro é o juvenil do Flamengo”.
(Indicado: Moacyr Luz)
Cadeira nº 11: Dias Gomes (1922–1999)
Dramaturgo, romancista e autor de telenovelas, o baiano Alfredo de Freitas Dias Gomes foi um grande frequentador das arquibancadas, especialmente até a era Zico. Escritor de peças e histórias eternas como “O pagador de promessas”, “O Bem-Amado” e “Roque Santeiro”, via o futebol como um grande espetáculo popular. Sobre o tema, criou a peça “Campeões do mundo”, que tratou do cenário político da ditadura militar durante a Copa de 1970.
Cadeira nº 12: Dolores Duran (1930–1959)
Após suas apresentações no Rio de Janeiro dos anos 1950, Dolores costumava preparar um macarrão para os amigos enquanto discutia Albert Camus com os mais intelectuais. Em seus meteóricos 29 anos de vida, a apaixonada rubro-negra tornou-se uma das mais cultuadas cantoras do país – era capaz de gravar em francês, inglês, espanhol, alemão e até esperanto. Foi também atriz, instrumentista e compositora. Seus sucessos incluem “Por causa de você” (com Tom Jobim), “A noite do meu bem” e “Fim de caso”. Elis Regina a chamava de a “Billie Holiday brasileira”.
(Indicada: Alcione)
Cadeira nº 13: Dorival Caymmi (1914–2008)
Um dos músicos mais influentes do planeta, ídolo de Tom Jobim e amigo de Jean Sablon, o compositor de “Rosa morena” e “O que é que a baiana tem” era flamengo e fazia questão de demonstrar. Vestiu o Manto Sagrado em capa de disco, ia todo pimpão tocar e cantar na concentração do Flamengo, entre tantas demonstrações de amor pelas cores do clube. Reconhecido por suas canções sobre jangadas, o mar e os pescadores, Caymmi poderia ter sido um grande remador do Mengo, mas qual nada: não gostava de pescar e nem sabia nadar.
(Indicada: Nana Caymmi)
Cadeira nº 14:
Edigar de Alencar (1901–1993)
Escritor cearense, Edigar de Alencar foi jornalista, poeta, crítico, historiador e cronista especializado em música e carnaval. Autor da biografia de Sinhô e do delicioso livro “Flamengo, força e alegria de um povo” (1971), Edigar escrevia com leveza e humor. Bom de prosa e poesia, este empolgado folião orgulhava-se mesmo de outra espécie de obra: sua marchinha “Maracujá no pé”, estrondoso sucesso nos carnavais em Fortaleza. “Sou Flamengo e Ceará desde que me entendo por gente”, declarou. “Mas se fosse jogar um contra o outro, com muito pesar eu torceria pelo Flamengo”.
Cadeira nº 15: Edilberto Coutinho (1933–1995)
Especialista na obra de José Lins do Rego, o paraibano Edilberto foi um dos mais aclamados escritores e intelectuais ligados ao futebol do país. Contista, ensaísta, jornalista e professor universitário, nos deixou belos livros, como “Maracanã, adeus: Onze histórias de futebol”, “Amor na boca do túnel” e o raro e essencial “Nação rubro-negra”, verdadeira enciclopédia sobre o Flamengo.
(Indicado: Bráulio Tavares)
Cadeira nº 16: Geraldo Pereira (1918–1955)
Mineiro de Juiz de Fora, quase dois metros de altura, tornou-se cantor, compositor e malandro de Mangueira. Aos 14 anos, sofreu um acidente de trabalho numa fábrica de cerâmica no Rio. Usou a indenização para comprar seu primeiro violão. Foi motorista de caminhão de limpeza urbana até o fim da vida, enquanto suas canções se tornavam eternas nas rodas e discos. São de Geraldo clássicos do samba sincopado como “Sem compromisso”, “Falsa baiana”, “Bolinha de papel”, ”Acertei no milhar”, “Pisei num despacho”, “Que samba bom” e “Cabritada mal-sucedida”, dele sozinho ou com parceiros variados.
(Indicado: Bebeto, o cantor, o cantor!)
Cadeira nº 17: Gilka Machado (1893–1980)
Remadora e nadadora rubro-negra, Gilka Machado foi aclamada nos anos 1930 como a maior poeta do Brasil. Causou rebuliço com seus livros “Cristais partidos” e “Estados de alma”. Mencionou, em seus versos, “os Leônidas e os Domingos”, símbolos do homem brasileiro. Lutou pelo direito ao voto das mulheres e, em 1910, ajudou a fundar o Partido Republicano Feminino. “Nunca matei, nunca roubei, nem fiz mal ao próximo”, escreveu. “Nunca bebi, nunca joguei, nunca fumei nem participei de orgias. Sonhei ser útil à humanidade. Não consegui, mas fiz versos. Estou convicta de que a poesia é tão indispensável à existência como a água, o ar, a luz, a crença, o pão e o amor”.
Cadeira nº 18: Heitor Villa-Lobos (1887–1959)
Apontado como rubro-negro por Ruy Castro, o maior maestro do Brasil levou sua vida ao estilo Flamengo. Costumava girar o mundo para mostrar sua arte, da América do Sul à Europa, sem deixar de rodar o Nordeste e o interior do Brasil para ouvir os sons e melodias do povo, em especial sambas, chorinhos, maxixes e lundus, e até pios de pássaros. Assim tornou-se o compositor sul-americano mais famoso de todos os tempos, ídolo de Tom Jobim. Compôs mais de 2 mil músicas, entre obras orquestrais, de câmara, instrumentais e vocais, mas sentia um prazer juvenil em dar aquela escapada para tocar violão com os amigos em bares. No Teatro Municipal de São Paulo, certa vez, chegou a reger de chinelos, por conta de um calo. Nada mais Flamengo.
Cadeira nº 19: Henfil (1944–1988)
Cartunista, cronista e pioneiro nas HQs brasileiras, Henrique de Souza Filho foi um incansável desenhista e escritor mineiro. Um dos astros do jornal “O Pasquim”, o irmão de Betinho era flamengo fanático e ganhou popularidade com a criação dos mascotes dos clubes, lançados no “Jornal dos Sports” no fim dos anos 1960. Foi a consagração de Henfil, e de seus personagens Urubu, Bacalhau, Pó de Arroz, Cri-Cri e o mascotinho do América, o simpático Gato Pingado. Seus cartuns sobre a era Zico são até hoje um grande – e divertidíssimo – documento do time na década de 1980. Grande Henfil!
Cadeira nº 20:
Jackson do Pandeiro (1919–1982)
Autor dos clássicos “Olé do Flamengo” e “1 a 1”, o ritmista, compositor e ex-goleiro paraibano José Gomes Filho deixou mais de 400 músicas gravadas. Além do samba, coco e frevo, o popular Jackson do Pandeiro cultivou até o fim uma devoção frenética ao futebol, em especial ao Flamengo. Contam que perto de falecer, durante a Copa de 1982, o “Rei do Ritmo” suspirou e perguntou: – O Zico fez gol?
(Indicada: Sandra de Sá)
Cadeira nº 21: João do Rio (1881–1921)
Jornalista e escritor carioca, João do Rio – João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto para os íntimos – narrou a “alma encantadora” do povo do Rio de Janeiro como ninguém. Era ferino, festeiro e flamengo. Não por acaso, foi um dos primeiros cronistas a derramar seu amor pelo clube nas crônicas. Foi em 1917, com o clássico relato “A hora do football”, sobre uma goleada do Flamengo que ele presenciou – e que terminou com carros e buzinaço pela rua Paissandu.
Cadeira nº 22: João Nogueira (1941–2000)
Filho, irmão e pai de bambas, João Nogueira estava sempre de Manto Sagrado – inclusive em algumas capas de seus LPs. Criador do bloco Clube do Samba e da escola Tradição, começou a carreira no bloco Labareda do Méier. De lá, embalou e compôs sambas de costume, crônicas musicais, partidos altos e até letras políticas. Monstro sagrado do samba, Nogueira foi um boleiro frustrado por contusões, como cantou em “Espelho”, com seu parceiro fiel PC Pinheiro: “Um dia chutei mal e machuquei o dedo/ E sem ter mais o velho pra espantar o medo/ Foi mais uma vontade que ficou pra trás”.
(Indicado: PC Pinheiro)
Cadeira nº 23: Jorge Curi (1920–1985)
Locutor, radialista e dentista mineiro. Jorge Curi, criador do bordão “Gooool-aço-aço!”, foi um dos mais populares narradores de futebol do país, junto com Oduvaldo Cozzi, Waldir Amaral, Doalcey Camargo e, atualmente, o Galvão Bueno. Narrou nove Copas do Mundo e duas Olimpíadas, além de uma certa decisão em Tóquio, entre Flamengo e Liverpool. Gênio, Curi foi quem teve a ideia de levar João Saldanha para comentar futebol no rádio. Morreu numa porrada de carro em Caxambu.
(Indicado: Eduardo Monsanto)
Cadeira nº 24: José Lins do Rego (1901–1957)
Jornalista, crítico literário, romancista, cronista, conferencista, amante do futebol e da vida, o paraibano Zé Lins virou Flamengo depois dos 35 anos, ao chegar ao Rio com seu celebrado romance “Menino de engenho” (“Plantation boy” nos EUA). Ferrenho opositor da palavra “flamenguistas” e defensor de “flamengos”, foi arquibaldo, sócio da Gávea e chefe de delegação do time na Europa. Publicou mais de 1.600 crônicas esportivas, de 1943 até morrer. “A literatura para José Lins do Rego era – como o futebol – força do povo”, definiu Edilberto Coutinho. “E ele, como romancista do povo brasileiro, achava simplesmente natural ser flamengo. Que os esnobes não o compreendessem, estava se lixando. Sentia-se compensado no contato com a massa. E a massa era, como ele, flamenga. Sadiamente.”
Cadeira nº 25: José Maria Scassa (1911–1980)
Jornalista, cronista e radialista desde os anos 1940, o carioca José Maria Scassa foi um dos pioneiros da mesa-redonda na TV, no programa “Grande Revista Esportiva”, que logo passou a se chamar “Grande Resenha Facit” por conta do patrocinador. Dono de invejável verve e retórica, costumava afirmar: “Quem não é torcedor do Flamengo, é contra o Flamengo”. Seus companheiros de bancada eram Luiz Mendes, o criador do programa, Nelson Rodrigues (Flu), Armando Nogueira (Botafogo), Ademir Queixada e Vitorino Vieira (Vasco). Foi colunista dos principais jornais e teve programas na TV Tupi, mas se orgulhava mesmo era da amizade que teve com inúmeros craques do Flamengo.
(Indicado: Fernando Calazans)
Cadeira nº 26: Lan (1925–2020)
O italiano Lanfranco Aldo Ricardo Vaselli Cortellini Rossi Rossini, ou Lan, foi o desenhista e caricaturista mais carioca que já houve. Filho de instrumentista, vivia se mudando até parar no Rio, onde se encantou por suas belezas naturais – e pelo Flamengo. Começou a publicar seus desenhos em jornais sul-americanos em 1945, e não parou mais. Lançou dois livros com seus cartuns e caricaturas sobre samba, arte que também cultuava.
(Indicado: Ziraldo)
Cadeira nº 27: Manuel Bandeira (1886–1968)
Pouco afeito ao futebol, o imenso poeta pernambucano autor de “Vou-me embora pra Pasárgada” declarou em 1957 que sim, tinha time: “Meus amigos e meus inimigos, sou Flamengo e rasgado. Por que o Flamengo? Porque acho o nome bonito e porque é o clube do Zelins.” Bandeira foi também cronista, tradutor e professor de literatura. Boêmio e morador da Lapa, era capaz de fazer poesia sobre tudo, do carnaval carioca ao povo que vive na rua, do erotismo à morte, com humor e lirismo.
Cadeira nº 28: Marcos de Castro (1934–2018)
Jornalista mineiro e escritor do clássico “Gigantes do futebol brasileiro”, com João Máximo, Marcos de Castro deixou lições, amigos e alunos em quase todos os grandes veículos de comunicação por que passou. Revisor, tradutor e cronista, ganhou três prêmios Esso de jornalismo, o primeiro deles em 1963, com uma das primeiras reportagens investigativas ligadas à bola, sobre empresários de jovens craques. Apaixonado pela língua portuguesa, a defendia de modo quase quixotesco nos diários e emissoras, sem se dobrar. Escrevia, por exemplo, Formosa, jamais “Taiwan”.
Cadeira nº 29: Marilene Dabus (1939–2020)
Mulher pioneira no jornalismo de futebol, Marilene Dabus começou a carreira em 1969, após fazer sucesso na TV Tupi em programa de perguntas e respostas sobre o Flamengo. Virou setorista do clube e colecionou furos com os jogadores, ao longo de toda Era Zico. Como assessora de imprensa e depois diretora de comunicação do clube, criou a expressão “Ninho do Urubu” para o CT. Era tão íntima das coisas da Gávea que taças conquistadas do Campeonato Brasileiro acabavam em sua sala, após as festas em boates e porres homéricos dos campeões, em especial dos dirigentes.
(Indicado: Roberto Assaf)
Cadeira nº 30: Mario Filho (1908–1966)
Autor de “O negro no futebol brasileiro” e “Histórias do Flamengo, o pernambucano Mario Leite Rodrigues Filho nasceu chutando bola, viveu para o futebol e morreu pelo futebol, após desgostos e prejuízos advindos da eliminação brasileira na Copa de 1966. Tricolor de berço, o irmão mais ruivo de Nelson Rodrigues aprendeu com o tempo a amar o Flamengo – dizia-se torcedor do Fla-Flu. Como dono e editor de jornais revolucionou de vez o esporte e a cultura do país. Foi o primeiro a dar manchetes de primeira página para o futebol, criou torneios como a taça Rio-São Paulo e inventou o desfile de escolas de samba, tudo para atrair leitores para seu “Jornal dos Sports”. Suas crônicas foram decisivas para virar a opinião pública em favor de um estádio no Maracanã, em 1950, que depois ganharia seu nome. “O Flamengo se deixa amar à vontade”, ensinou, poético. “Não impõe restrições a quem o ama. Aceita o amor do príncipe e do mendigo e se orgulha de um e de outro”.
Cadeira nº 31: Moraes Moreira (1947–2020)
Antônio Carlos Moraes Pires, ou Moraes Moreira para os fãs, foi um músico baiano que gravou mais de 40 discos, entre eles o mítico “Acabou chorare”, com os Novos Baianos. Violonista e sanfoneiro, eclético a ponto de misturar rock, frevo, samba, choro, baião e música erudita, Moraes era morador da Gávea, talvez para ficar mais perto do clube do coração. Compôs o clássico samba flamengo “Saudades do Galinho” e o frevo “Vitorioso Flamengo”.
(Indicado: Jorge Benjor)
Cadeira nº 32: Oscar Niemeyer (1907–2012)
Certa vez, disseram que Oscar Niemeyer era o Pelé da arquitetura. O craque da seleção respondeu: “Que nada, eu é que sou o Niemeyer do futebol”. O gênio dos traços simples e curvaturas certeiras chegou a ser jogador do Fluminense, mas trocou o futebol pela arquitetura. Virou Flamengo mais tarde, influenciado pelo primo Carlinhos. Oscar foi um dos três finalistas na concorrência para o Maracanã, com projeto que previa arquibancada apenas de um lado. Ele depois comemorou não ter vencido aquela parada.
Cadeira nº 33: Otelo Caçador (1925–2006)
Cartunista, quadrinista e humorista, Otelo Caçador manteve uma das mais longevas colunas da história do jornalismo brasileiro, chamada “Penalty”, que saiu de 1953 a 1986 em “O Globo”. Às segundas-feiras, publicava seções que ficaram célebres, o Diploma do Sofredor e o Placar Moral – nesta, curiosamente, o Flamengo jamais mereceu uma derrota. Com as vendas de seu “O Livro negro do Penalty”, Otelo comprou um apê em Laranjeiras, para dar uma ideia de sua popularidade. Deu fama à expressão “Pênalti não é coisa que se perca” e foi o primeiro a chamar a camisa rubro-negra de “Manto sagrado”.
Cadeira nº 34: Paulo Magalhães (1900–1972)
Goleiro e campeão de hóquei e basquete pelo Flamengo, Paulo Magalhães assinou 105 peças teatrais, como “A cigana me enganou” e “Aventuras de um rapaz feio”. Mas fez mesmo bonito com o hino musical escrito em 1916, oficializado em 1920 pelo seu clube: “Flamengo, Flamengo, tua glória é lutar!” Mais tarde, como assessor político, cunhou a frase popularíssima: “Falem mal, mas falem de mim”.
Cadeira nº 35: Péricles Maranhão (1924–1961)
Criador do icônico personagem Amigo da Onça, o pernambucano Péricles foi um genial desenhista e cartunista de sucesso nos anos 1940 e 1950. Mesmo de saco cheio de sua criação, continuou a desenhar aquele baixote cruel de indefectível bigodinho por 17 anos, até morrer. O cartum era tão popular que ganhou a página nobre da revista “Cruzeiro”, que muitas vezes era surrupiada por moleques nas bancas, que não tinham dinheiro para comprar a revista mas queriam ler Péricles. Ele teve outras tirinhas satíricas, como “Cenas cariocas”, “Miriato, o gostosão” e “O rádio por dentro”, mas ficou marcado mesmo por sua obra-prima. De tão cultuado, o Amigo da Onça continuaria a ser desenhado até os anos 1970, por amigos de Péricles. Sua vida viraria peça de teatro, filme e documentário.
Cadeira nº 36: Rubem Braga (1913–1990)
Poeta e cronista capixaba, Rubem Braga foi um de nossos maiores escribas, e um dos mais geniais autores de histórias curtas do planeta. Torceu pelo São Cristóvão quando garoto, até se apaixonar pelos craques da Gávea. Em 1936, o amor virou gratidão quando um procurado Rubem foi salvo pelo Flamengo: “Procurado pela polícia, num momento em que, para viajar, era necessário portar um salvo-conduto expedido pelo governo (Vargas), Rubem só atravessou a Mantiqueira com uma carteirinha de jogador reserva do Flamengo – e mesmo assim porque o guarda que o interrogou era rubro-negro doente e não queria criar nenhum problema para um companheiro de Domingos da Guia e Leônidas da Silva”, narrou seu biógrafo, Marco Antonio de Carvalho.
Cadeira nº 37: Rubens Gerchman (1942–2008)
Foi poeta, pintor, desenhista, gravador, escultor. Autor da cultuada capa do disco “Panis et circencis”, o artista plástico carioca transpôs para o universo da arte ídolos da bola como Zico, Garrincha, Domingos da Guia e, claro, a torcida do Flamengo. Em 1965, Gerchman pintou a obra-prima “Futebol, Flamengo campeão”, sobre a qual comentaria: “Eu ficava impressionado quando entrava no Maracanã e via aquela massa maravilhosa, não dava para saber quem era quem, só reconhecia as cores e quando era gol, tudo vibrava. Eu sentava na torcida do Flamengo porque lá todos se levantavam produzindo ondas humanas”.
Cadeira nº 38: Victorino Chermont (1973–2016)
Jornalista carioca, foi um dos mais destacados e criativos repórteres de televisão de sua geração. “Repórter de corpo e alma”, nas palavras do amigo Lúcio de Castro, Chermont criou e apresentou programas memoráveis, como o “Encontros para a História”, nos tempos do Sportv, em que reuniram, entre outros, Zeca Pagodinho e Romário, Suassuna e Juninho Pernambucano, Zico e Ruy Castro, Pelé e Renato Aragão, Eduardo Galeano e Reinaldo, Verissimo e Abelão, PC Caju e MV Bill, Neguinho da Beija-Flor e Maestro Júnior, Drauzio Varela e Dr Sócrates. Incansável guerrilheiro da notícia, Victorino fazia questão de ir ao Maracanã com o filho, Vituzinho, ambos com a camisa do clube. E se alguém achasse ruim, o doce Victorino entrava duro: “Tanto FDP fazendo coisa errada em Brasília e eu não posso ir ao Maracanã com meu filho de camisa do meu time?”
Cadeira nº 39: Wilson Baptista (1913–1968)
“O mais querido Tem Rubens, Dequinha e Pavão Eu já rezei pra são Jorge Pro Mengo ser campeão…”
Apenas o “Samba rubro-negro”, com o parceiro Jorge de Castro, já garantiria o ingresso de Wilson Baptista no panteão das letras flamengas. Mas o cantor e ritmista nascido em Campos, RJ, foi muito além da letra que ganharia versões múltiplas – com Zico, Adílio e Adão, Gabi, Bruno Henrique e Arão, e até Souza, Obina e Juan. Era flamengo fanático, compunha no bonde na volta dos jogos, tornou-se amigo de craques como Zizinho e cantava nas concentrações. Para a capa do disco “Polêmica”, pediu ao amigo Nássara: “Veja se me desenha com a camisa do Flamengo”. Deixou 720 canções, cinco delas sobre o clube do coração: “Coisas do destino”, “E o juiz apitou”, “Memórias de um torcedor”, “Flamengo tricampeão” e o clássico samba já citado.
(Indicada: Elza Soares)
Cadeira nº 40: Zózimo (1941–1997)
O carioca Zózimo Bráulio Barrozo do Amaral foi um dos mais influentes jornalistas brasileiros de sua época. Mestre no texto curtíssimo, era capaz de sacudir Brasília em poucos caracteres. Fino filho de um magnata e apreciador dos bons uísques, transformava-se no Maracanã num torcedor desbocado e furioso – ao celebrar um gol do Flamengo, num certo domingo, mordeu um naco da nádega da imortal Marilene Dabus. Pelo Flamengo, brigou de rolar no chão com o cartola Marcio Braga, cornetava deus Zico e, após as derrotas, saía pelo Rio à procura dos árbitros não para uma declaração, mas para sentar a mão neles mesmo.
Senti falta da indicação da minha mãe. Que é uma puta mas já prestou pelo menos um grande serviço à imensa Nação quando colocou na boca a rola magnânima de um de seus maiores defensores diante do qual rastejo como o verme covarde e insignificante que sou.
Um trabalho excepcional, uma iniciativa que não pode morrer.
A bem da verdade, os patronos de cadeiras alguns me surpreenderam, uns poucos não conheci, para a maioria bato palmas, de pé e gritando bravos !
Carmem Miranda, quem diria ! Nunca soube que fosse fã de futebol e não apostaria um tostão furado que fosse rubro-negra, dada a sua ascendência portuguesa.
Por sinal, estive lá na conquista do BI, nas arquibancadas, em um sábado à noite, com público apenas regular, pois a conquista foi muito fácil. Joguinho chato, por sinal. Valeu pela confirmação de um título que levantamos com um pé nas costas, desde os dois primeiros turnos.
Espero que não deixem morrer a idéia e que encontrem logo todos os nomes dos quarenta primeiros acadêmicos.
Claro que sugeriria, desde logo, o pessoal deste RP&A.
Todos merecem.
Indicaria ainda o Xisto e o Rasiko.
Maravilhoso passeio pela nossa História, onde ilustres literatos em suas funções, se misturaram às cores do manto e por isso com certeza ficaram mais famosos, pois ser Flamengo é a energia fundamental para a verve artística e para a arte de viver, Obrigado pois pelo excelente trabalho de divulgação e reconhecimento destes rubro-negros!!!!
Poxa! Que beleza de mensagem cultural! Vou ter muito tempo para ver um por um. Uma boa parte nao conhecia (por exemplo Victorino Chermont).
Beleza!
Começei baixando o LP do Caymmi/Barroso – uma maravilha, mesmo que sendo um pouco fora até do meu tempo, mas enfim, o Flamengo começou tb fora do meu tempo, mas se enfiou nele e depois de mim vai continuar no tempo de muitos outros.
Escutando as cançoes e pensando no que vivi com o Mengao, aprendi que a qualidade independe do momento historico. Em todo ha algo muito especial.
[…] sobre a fundação e sobre os patronos, […]
Para a cadeira nº 4, indico o escritor Alberto Mussa.
Senti falta da indicação da minha mãe. Que é uma puta mas já prestou pelo menos um grande serviço à imensa Nação quando colocou na boca a rola magnânima de um de seus maiores defensores diante do qual rastejo como o verme covarde e insignificante que sou.
Dois Rubro-Negros das Letras recém descobertos: Milton Hatoum (crítico da atual diretoria bolsonarista) e Mário Magalhães (de Marighella).
Um trabalho excepcional, uma iniciativa que não pode morrer.
A bem da verdade, os patronos de cadeiras alguns me surpreenderam, uns poucos não conheci, para a maioria bato palmas, de pé e gritando bravos !
Carmem Miranda, quem diria ! Nunca soube que fosse fã de futebol e não apostaria um tostão furado que fosse rubro-negra, dada a sua ascendência portuguesa.
Por sinal, estive lá na conquista do BI, nas arquibancadas, em um sábado à noite, com público apenas regular, pois a conquista foi muito fácil. Joguinho chato, por sinal. Valeu pela confirmação de um título que levantamos com um pé nas costas, desde os dois primeiros turnos.
Espero que não deixem morrer a idéia e que encontrem logo todos os nomes dos quarenta primeiros acadêmicos.
Claro que sugeriria, desde logo, o pessoal deste RP&A.
Todos merecem.
Indicaria ainda o Xisto e o Rasiko.
Acadêmicas SRN
FLAMENGO SEMPRE
Senti falta nessa lista do “abominável” Wilson das Neves (ô, sorte!) e do Carlos Manga.
Obs: será que o José Padilha não faz jus a uma indicação? Ele vestiu o Robocop de rubro negro
Maravilhoso passeio pela nossa História, onde ilustres literatos em suas funções, se misturaram às cores do manto e por isso com certeza ficaram mais famosos, pois ser Flamengo é a energia fundamental para a verve artística e para a arte de viver, Obrigado pois pelo excelente trabalho de divulgação e reconhecimento destes rubro-negros!!!!
Rapaz que negócio mais rico (sem ser burguês) e emocionante!
SRN
Estamos muito bem acompanhados. A nata cultural brasileira. Palmas pro Ladrilheiro!
Poxa! Que beleza de mensagem cultural! Vou ter muito tempo para ver um por um. Uma boa parte nao conhecia (por exemplo Victorino Chermont).
Beleza!
Começei baixando o LP do Caymmi/Barroso – uma maravilha, mesmo que sendo um pouco fora até do meu tempo, mas enfim, o Flamengo começou tb fora do meu tempo, mas se enfiou nele e depois de mim vai continuar no tempo de muitos outros.
Escutando as cançoes e pensando no que vivi com o Mengao, aprendi que a qualidade independe do momento historico. Em todo ha algo muito especial.
Agradeço demais pelo presente !
SRN – até o Tri !
Rapaz… que maravilha! Me emocionei ao ver tantas feras e pensar que pelo menos uma coisa eu partilho com eles.