Todo mundo sabe que faltam dez dias para a final da Libertadores. Porque desde 29 de setembro, quando o Flamengo garantiu a sua classificação vencendo o Barceloninha em Guayaquil, que a Nação rubro-negra substituiu o simbolismo do Natal, do Ano Novo e do Carnaval, e as suas respectivas centralidades enquanto marcos temporais, pelo 27 de novembro.

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Quando César, o Júlio, não o terceiro goleiro, com a consultoria do sábio Sosígenes de Alexandria, abandonou o conceito de anos lunares e instituiu o calendário juliano em 46 a.C., os romanos, e depois a maioria dos povos ocidentais, passaram a usar como referência para os seus calendários o tempo decorrido pelo Sol para completar um ciclo de estações (primavera, verão, outono e inverno). Um grande avanço para a humanidade. Mas se não fosse a reforma do calendário juliano promovida pelo Papa Gregório XIII no século XVI, que corrigiu uma falha de cálculo gerada pelas imprecisões das medições astronômicas da antiguidade, essa final poderia ter rolado 10 dias antes.

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Mesmo antes da classificação do Flamengo para a sua terceira final de Libertadores o dia 27 de novembro já possuía relevância para a história. Em 1807, foi no 27 de novembro que a família real portuguesa, ameaçada pelas tropas napoleônicas, deu fuga pro Brasil e iniciou a saga do Império tropicalista, da Biblioteca Nacional Brasileira e daquele chiadinho gostoso do falar carioca.

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Os católicos, em especial os devotos marianos, comemoram em 27 de novembro o Dia de Nossa Senhora das Graças, uma invocação da Virgem Maria relacionada às suas aparições à Santa Catarina Labouré, que na época jogava nas divisões de base, como noviça da Congregação das Filhas de Caridade de São Vicente de Paulo em Paris.

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Foram essas aparições que iniciaram o culto da Nossa Senhora das Graças da Medalha Milagrosa, que é uma confirmação de um bom dogma, considerando-se que campeões e vices da Libertadores 2021 ganharão suas medalhas. Talvez seja um bom dogma, mas não se sabe se é um bom augúrio. O vice da Libertadores não deveria ganhar é nada além das merecidas vaias. Como se sabe, final de Copa não é pra se jogar, é pra se ganhar.

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Tricentésimo trigésimo primeiro dia do ano, 27 de novembro foi também o dia em que rolou a pitoresca Intentona Comunista no Brasil de 1935. Uma tentativa malsucedida de alguns tenentes liderados pelo mítico Cavaleiro da Esperança, Luiz Carlos Prestes, com o apoio da Aliança Nacional Libertadora e da III Internacional Comunista, para apear do poder o suposto ditador Getúlio Vargas.

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A motivação pro golpe podia até ser boa, que ninguém merece governo autoritário e ladrão, mas o preju foi enorme. Os comunistas foram colocados na ilegalidade e Getúlio ficou mais 10 anos no poder, o mesmo tempo que Luiz Carlos Prestes tirou de cadeia. O Komintern vacilou muito acreditando nos relatórios sobre a situação política nacional enviados por entusiasmados comunistas baianos.

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Foi também no dia 27 de novembro que nos despedimos do dramaturgo Eugene O’Neill, de Aparício Fernando de Brinkehorff Torelli, o Barão de Itararé, da Enciclopédia Nilton Santos e do Capitão Cláudio Coutinho, figura seminal na construção do mítico Flamengo Campeão do Mundo que em dezembro de 81 botou os ingleses na roda.

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Mas o 27 de novembro não é só tristeza. Foi o dia do nascimento de Bruce Lee, Jimi Hendrix, Roberto Leal e Vera Fischer, aliás, deixo aqui os parabéns adiantados para essa musa. Foi também em um lindo 27 de novembro que o Flamengo conquistou o tricampeonato da Copa do Brasil num Maracanã lotado de gente bem vestida que vibrou quando o capitão Leo Moura levantou o troféuzão acima da cabeça.

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Enquanto o esperado 27 de novembro não chega o Flamengo vai fazendo o que pode pra se manter vivo também no Brasileiro. A matemática não larga nosso pé e o Flamengo segue à uma distância segura do líder provisório, talvez segura demais. O que é indiscutível é que nos últimos jogos o Flamengo deu alguns sinais de renascimento, que aumentou ainda mais a proverbial humildade reversa do povo bem vestido. A moral tá lá no alto.

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A vitória protocolar sobre o Bahia, que provocou um chororô despropositado e insano da turma da Itinga, e o chocolate aplicado nos trânsfugas do São Paulo, serviram para alertar ao mundo que o Flamengo não tá de bobeira no Brasileiro e que se vagabundo der mole nóis panha. Mas ainda é pouco para eclipsar o fascínio provocado pela final da Libertadores. Brasileiro é feijoada, às vezes fica pesado pra digerir. Vamos focar no caviar, que a vida é muito curta.

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Cada torcedor do Flamengo carrega dentro do peito a sua lista de prioridades, mas é bastante incomum encontrar alguém que não coloque a conquista do TRI da América como o Santo Graal de 2021. Brasileiro é muito bom, gostamos tanto que já ganhamos oito, todos dentro de campo e comemorados pela torcida no mesmo dia. Mas nada mais justo que a Libertadores, pela sua dificuldade e raridade, seja o grande objeto de desejo das massas mulambas.

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De hoje até a grande final em Montevideo vão ser dez dias de grande ansiedade. E que vão demorar muito a passar, todo mundo já está devidamente familiarizado com as deformações na malha espaço-tempo provocadas pelo Flamengo. Viva a Ciência! Por sorte teremos alguns compromissos pelo Brasileiro, como o jogo com o Corinthians hoje à noite no Maracanã, que vão dar pra distrair um pouco da inescapável vigília do calendário. Nossa cabeça já está no Centenário, agora só falta o corpo.   

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Mengão Sempre

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