Há muito tempo não rolava um jogo tão sensacional quanto esse Grêmio x Flamengo. Foi emoção pura o tempo todo, com várias reviravoltas no roteiro e um desfecho que, apesar de previsível, levou a torcida do Flamengo à catarse. O cenário ideal planejado pelo torcedor rubro-negro era justamente esse: ganhar com folga dentro da casa do inimigo, acabar com as palhaçadinhas farroupilhas no nascedouro e servir uns bons drinks e salgadinhos no jogo da volta no Maraca.
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Admitamos, uma porralouquice completa, os gaúchos jamais tinham perdido um jogo de 4×0 na Copa do Brasil, jamais tinham levado 4 cocos dentro de casa e estavam encarando a Copa do Brasil, hoje para eles finada, como a tauba de salvação do naufrágio em que vivem durante a temporada. Ainda assim, pelos caminhos mais tortuosos, pelas vias mais íngremes e através das sendas mais estreitas o Flamengo conseguiu exatamente o que o seu torcedor mais alucinado planejou. Esse Flamengo aí, tem jeito não. Só matando.
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No primeiro tempo o jogo foi bem igual, aliás, foi surpreendente o bom futebol dos gremistas. Se jogassem daquele jeito sempre, e não apenas contra o Flamengo, não estariam nessa falência esportiva que tanto consola o torcedor colorado. Marcando muito e não deixando o Flamengo ficar com a bola, o Grêmio poderia até ter endurecido o jogo se fosse capaz de alguma ação ofensiva consciente. Mas é time do Felipão, né? Só sabe destruir, enfiar a porrada e torcer pra acontecer algum milagre de improvável comprovação lá na frente.
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Aos 33 minutos do primeiro rolou o lance capital, que mudou todo o jogo. Um seilaquenzinho lá deles, que já vinha empregando força desproporcional e esquentando a chapa sem necessidade, pisou na cabeça do Everton Ribeiro e não satisfeito ainda quis dar esporro no nosso craque enquanto ele ainda estava no chão. Sob o olhar complacente do fraquíssimo juiz careca. Que nada fez pra coibir a violência.
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O que ele fez foi tentar esfriar o jogo, o jogo do Flamengo, que fique bem entendido. Distribuiu amarelos com extrema deselegância e injustiça, mas só pro Flamengo. E na primeira oportunidade que teve para aplicar um vermelho num jogador do Flamengo não hesitou. Isla foi pro chuveiro e o Flamengo teve que segurar uma pressão incipiente do Grêmio antes de poder ir pro vestiário se reagrupar.
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Talvez tenha sido um dos melhores vestiários da temporada, certamente o melhor vestiário de Renato no Flamengo. Não se sabe o que rolou lá dentro, mas funcionou demais. Jesus dava altos esporros nos caras, isso é notório e o time mostrava em campo quando voltava pro segundo tempo que as reprimendas de caráter moral do Míster calavam fundo no coração e nas mentes dos nossos craques.
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Ainda não sabemos o que é que Renight faz com os caras nos intervalos, mas não deve ser esporro, talvez ele mostre algum trecho edificante do seu premiado DVD. Só sabemos que rola uma alquimia forte e se separa a terra do fogo e o sutil do espesso com muito engenho. O que era chumbo vira ouro e os nossos caras voltaram pro segundo tempo voando. Assim, logicamente, toda a obscuridade foge do Flamengo quando estamos rumo a Tóquio.
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O apito trilou a bola voltou a rolar e se iniciou, com grande pompa, o Massacre dos Renegados. Todos aqueles que ainda lutam para angariar a simpatia e a condescendência da torcida rubro-negra, que são fundamentais para o sucesso na Gávea, foram tocados por energias cósmicas de origem ainda ignota. O massacre dos proscritos já começou com o improbabilíssimo gol de Bruno Vianna, num bom chute que ainda teve o capricho de resvalar nas coxas traíras de Rafinha. Depois daí foi só lazer.
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O Grêmio soltou os baguais, mandou geral pra frente e nos deram o contra-ataque. Ficou fácil demais. Perdemos chances em sequência, geradas por espertíssimas trocas de passes humilhantes e certeiros. Everton Ribeiro, que foi um ninja, perdeu um gol incrível e acabou substituído. Mas o Sr. Vítor entrou no seu lugar com tamanha disposição que mal tivemos tempo pra lamentar a sua saída. Colocou Michael na cara do gol e o azougue goiano não deu mole, jogou lá dentro e fez 2×0.
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Felipão nessa hora já estava a fim de ir pra casa, mas infelizmente não deu. O Grêmio continuou a la loka, indo com tudo pra frente pra defender o bom nome do futebol norte uruguaio, mas se foderam completamente. O Flamengo brincou lá na frente, sem renunciar ao máximo rigor na cozinha. Os gremistas não se criavam.
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O Sr. Vitor, eficientíssimo e generoso, cruzou uma bola perfeita na altura dos peitos do Rodinei. O vigoroso animador de resenhas corrigiu a posição do corpo e meteu a cabeça na bola, que morreu gostosa na rede do Chapecó. Nos CTGs do mundo começaram a apagar as luzes, a imortalidade gremista, que por não ser impressa não é auditável, tinha sido desmascarada mais uma vez. Os cara morreram mesmo e só lhes restou baixar a madeira.
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Providencia inútil, o Flamengo continuou a bagunçar com as tradições dos pampas e com o auxílio de uma raríssima e episódica intervenção correta do VAR, a arbitragem conseguiu acertar alguma coisa. Pênalti claro em Michael, bola na cal, Sr. Vitor correu, bateu e guardou, arredondando os números do placar e correndo pros braços da companheirada em êxtase à beira do gramado. Missão cumprida, pode comemorar.
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O Flamengo foi muito correto, não deixando pra depois o que poderia ser resolvido hoje. E já está na semi da Copa do Brasil. O jogo da volta vai ser treino com uniforme. Falta pouco pra levantarmos mais essa tacinha e cumprirmos com mais uma obrigação. Todos os jogadores, sem exceção, estão de parabéns pelo resultado grandioso. O time demonstrou uma raça absurda, dedicação e sangue no olho que às vezes, pelas facilidades criadas pelos seus próprios méritos, acabam ficando em segundo plano, por não serem necessárias. Mas quando o Grêmio chegou junto e a chapa esquentou baixou um Rondinelli na rapaziada. Nessas condições espirituais é impossível o Flamengo perder.
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Um grande feito do Flamengo, mas como mostram os últimos nove resultados do duelo, um acontecimento banal que deve ser comemorado com moderação. Ainda não ganhamos porra nenhuma. O Flamengo de Renight banalizou o 4×0, já não surpreende ninguém. Inédito, inaudito, épico e memorável foi o feito do Grêmio, o primeiro clube a tomar quatro gols de um time treinado por um cara que tem uma estátua no seu estádio. Vai ser muito difícil alguém superar essa marca.
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Mengão Sempre
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