É muito chato toda hora ter que lembrar que o futebol, conforme o conhecemos, não tem sido praticado no país desde março de 2020 por causa da pandemia de coronavirus. É chato, mas necessário, porque vagabundo continua a desafiar a morte achando que o covid-19 é bagunça. Assim como tem gente que não consegue enxergar mal nenhum que os campeonatos de futebol continuem a ser disputados enquanto todo dia tá morrendo gente de montão.

Nem adianta argumentar, mas se o futebol não faz mal nenhum à saúde pública, não contribui para a disseminação da doença e não dá palco para idiotas praticarem o negacionismo em público por que réveillon, churrascos, chopadas, festchenhas e furdunços em geral fariam? Libera logo tudo, os malandro muito machos que quiserem enfrentar o vírus e morrer não devem ter seu direito cerceado, assim como o dos otários e maricas que preferirem não trocar perdigotos ou nadarem em volta de um cagalhão na praia.  Vale a Lei de Muricy, cada um cuida de si. Cada um no seu quadrado, quem ficar vivo por último ganha.

Há mais ou menos um ano minha grande preocupação na vida era me organizar financeiramente para não ser pego novamente de calças curtas na hora em que o Flamengo tivesse que jogar as quartas ou as semis da Libertadores 2020 em territórios hostis antes da nossa participação no desfecho quase certo da competição já marcado pro Maracanã. Vanitas vanitatum et omnia vanitas.

Uma preocupação que retrospectivamente, diante de tudo que aconteceu no planeta nos últimos 12 meses, se mostraria mesquinha e ligeiramente idiota, mas que serve para ilustrar o tamanho do tombo que o Flamengo proporcionou ao mulambo médio. Ao menos àqueles mulambos médios que como eu não botaram fé no provérbio iídiche “Mann Tracht, Un Gott Lacht” (Humanos fazem planos e Deus ri.).

Não é difícil imaginar O Cara rindo lá da gente desde o ano passado. Desde que o vírus brotou e Jesus deu linha que o Mengão vem ladeira abaixo. A realidade em janeiro de 2021 é o Flamengo se agarrando aos escassos fios de cabelo da entidade mística Chance Matemática pra ver se consegue pelo menos a mixaria de ser octacampeão do Brasileiro, que todos sabem ser mera obrigação.

Posto que o cumprimento de tal obrigação já não depende apenas do Flamengo, nós torcedores podemos ao menos nos tranquilizar sabendo que a questão do Octa já não está mais circunscrita ao limitado e excessivamente cartesiano campo do desempenho esportivo, sendo agora matéria a ser decidida exclusivamente pelos desejos e desígnios dos deuses travessos que regem o futebol, ou mesmo do Deus chefe, se é que Ele tem tempo pra essas miudezas em tempos de pandemia.

A dor de barriga vem mais do céu do que daquilo que se ingeriu e do mesmo jeito que o Flamengo andou flatulando quando não podia (castigo por supostas más ações?) os paraguaio temporariamente à nossa frente na tabela podem peidar também. Se não for com a ajuda dos amiguinhos o Flamengo não será campeão, mas é importante ressaltar, que o Flamengo tem que ajudar os outros a o ajudarem.

E não dá pra considerar o futebol apresentado pelo time nas suas últimas aparições no Brasileiro como uma ajuda efetiva. Estamos na briga ainda porque o nível do campeonato é excessivamente rasteiro, mas em CNTP o Flamengo tem jogado futebol pra Sul americana, no máximo. Pode ser que melhore, mas pode ser também que piore. Essa dialética que fode com tudo.

Veja o caso do Diego Alves, uma novela do caralho pra renovar, debate público, troca de acusações, facadas nas costas e o escambau. Renovou, acertou um cacau responsa, todos felizes. Aí Diego Alves, demonstrando um apurado senso de oportunidade, se contunde e não joga mais o Brasileiro. Na hora da onça se hidratar vamos de Hugo, César e torcer pra nego não chutar no nosso gol. Pelo menos Diego Alves não toma mais gol bobo nesse campeonato.

Apesar da positividade natural do rubro-negro andar vendendo a ideia de que a tabela nos é favorável, na dúzia de jogos que ainda nos restam não tem nenhuma moleza. No monte de time ruim que vamos enfrentar encontram-se os recalcados com sacodes recentes, os empolgados com a ilusão do título, os desesperados pra não cair, inimigos figadais e uns cinco clássicos. Isto é, muito nego pra dar rasteira e poucos a fim de cair.

Mas nada de desespero, pelos mesmos motivos místicos que nos indicam que não devemos fazer planos é de bom tom segurar a onda nas previsões também. Com a tragédia que se abateu sobre o Ninho do Urubu logo nos primeiros dias de 2019 não foram poucos os rubro-negros que declararam que aquele que se revelaria o Ano Mágico estava definitivamente perdido. 2020 foi um cu em obras, verdade, mas o bagulho só acaba quando termina e o Flamengo é habituado a vencer páreos importantes no fotochart.

A torcida segue confiante, tenho fé que para a maior parte dela só uma coisa é mais importante do que o Flamengo conquistar o Octa Brasileiro: que todos nós possamos estar vivos e com saúde pra comemorar esse título e os próximos. Por isso faço um apelo na boinha, se cuidem, caralho. Só assim vai ser possível cuidar dos outros.

Mengão Sempre