Qualquer materialista dialético chegado na santa palavra sabe que está escrito lá na bíblia que tudo que é sólido desmancha no ar. E quem leu a bíblia em primeira mão não precisou de nenhuma exegese de Marshall Berman para entender o que o salmista quis dizer com a frase – que as paradas, todas as paradas, estão em constante mutação. Ou seja, as paradas, o substantivo genérico que é um dos pilares centrais da linguagem carioca, podem ser tudo, menos paradas. E pur si muove!
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Vejam o caso do Campeonato Carioca, até ano passado a competição era apenas um trambolho atravancando o caminho entre uma pré-temporada digna deste nome e um grau de dedicação mínima à Libertadores. A crítica esportiva, a opinião pública, a corneta popular e o senso comum estabeleceram, baseados na atenta observação crítica de fatos, que os Cariocas eram um atraso na vida do Flamengo e deveriam ser evitados.
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Mas isso foi no ano passado, em 2023, ano da tecnologia, em que o futebol mundial tenta acertar o seu calendário depois da zona instalada com a Copa do Mundo no areal catari, o Carioca passou a ser uma coisa boa, inclusiva e politicamente correta. Porque logo no começo de 2023 o Flamengo tem um Mundial pra ganhar.
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Um compromisso de tamanha importância que obrigou o Flamengo a abandonar a boa prática de deixar que as fases mais café-com-leite do nosso centenário rural fossem disputadas pelos crias e renegados, enquanto os titulares aperfeiçoavam corpos e mentes em treinos secretos visando as competições que realmente importavam.
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Mas com a decisão da Supercopa contra o freguês porcino no fim de janeiro e a estreia no Mundial na primeira semana de fevereiro, colocar o time AAA em ação se tornou mandatório, mesmo que o que esteja em jogo seja apenas uma quantidade limitada de mariolas. Os craques do Flamengo não podem ficar na cristaleira, precisam jogar, queimar banhas, recuperar entrosamento, se fazerem competitivos. E o mais importante, eles precisam se exibir e serem vistos pelos seus seguidores.
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Porque a religião Flamengo funciona de forma análoga às religiões que congregam os devotos do Sol. A adoração às deidades solares é milenar, há 5000 anos os egípcios já tinham seus cultos solares, como os de Ámon, Rá, Hórus e Áton. Os persas adoravam Mitra, os hindus cultuavam Surya e Savitar, os incas se ajoelhavam para o poderoso Inti, os gregos pagavam pau para Apolo e Hélios e criaram até o termo pra englobar todas essas maluquices: a heliolatria.
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O culto ao Sol ficou pop porque possuía um diferencial em relação aos deuses monoteístas. Ao contrário dos inúmeros 01 das religiões reveladas, sempre encobertos por espessas nuvens místicas, camadas extras de mistérios e obstinada defesa da própria privacidade, o Sol tava sempre na pista.
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O astro rei podia ser visto diariamente com horário certo, seu poder podia ser percebido com os olhos, sentido na pele, as colheitas que alimentavam as gentes eram a prova da sua obra divina demonstrada safra após safra. Toda essa exposição, pelo menos na turma dos deuses, aumentava sobremaneira a sua credibilidade.
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Ora, esse Flamengo de agora é, futebolisticamente falando, o que até agora mais próximos conseguimos chegar de uma corporificação do termo apolíneo. Esse Flamengo ilumina, aquece, nutre, fertiliza, marca o tempo e ainda faz fotossíntese, transformando desertos áridos em abundantes hileias sensoriais.
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Mas pra isso tudo acontecer o Flamengo, assim como o Sol, tem que aparecer. É preciso que o Flamengo esteja na pista para manter viva a crença de seus seguidores na sua existência, prescindindo da fé, uma exigência que costuma afastar os céticos das religiões reveladas e bombar a audiência dos animistas.
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Se o Flamengo tem um Mundial marcado, não pode ficar encoberto pelas nuvens, é preciso brilhar, cruzar os céus, desfazer as trevas, iluminar as sombras, esquentar os corpos e aquecer os ambientes. O Flamengo tem que continuar a sua trajetória cósmica exibindo seus artistas, confirmando para os seus crentes a existência dos já lendários Arrascaetas, Ribeiros e Gabigols, mesmo que seja no chumbrega Carioca.
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A exemplo do que o Flamengo fez no domingo, quando botou a sua tropa de elite para terçar canelas com a valente Portuguesinha no gramado do Maracanã, hoje, às 7 da noite lá no Espírito Santo (o sofisticadíssimo conceito cristão da terceira pessoa da Santíssima Trindade que trabalha com Deus Pai e Deus Junior, digo, Deus Filho, para compor o 01 do monoteísmo) o Madureira vai ter que encarar o Flamengão Fuderosão Só Com Titularzão.
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Tá certo o Vitor Pereira, que não aceita orações apressadas no vestiário, em partir pra cima dos tricolores suburbanos com a força máxima. Tá pensando que Mundial é bagunça? O time principal do Flamengo tem que jogar o maior número possível de partidas antes dos compromissos marroquinos. Enquanto entrosa os craques e dá ritmo aos descansados, reforça a crença das massas.
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Então fica combinado, agora o Campeonato Carioca não é uma inutilidade mantida respirando por aparelhos só pra fazer o Flamengo sustentar seus lamentáveis coirmãos hipossuficientes. O Carioca, pelo menos o de 2023, é o necessário trampolim para as vitórias em Tânger e Rabat.
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Para que esse negócio de religião continue solvente o Sol há de brilhar mais uma vez, a luz há de chegar aos corações. Só assim do mal será queimada a semente e o amor será eterno novamente. Se amostra, Flamengo!
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Mengão Sempre
Tô atrasado porque já tinha desistido, mas quando eu for grande quero escrever qui nem o Arthur.
REAL MADRID PODE ESPERAR A TUA HORA VAI CHEGAR….
SRN !
Gérson de volta. Arthur de volta. 2023 promete. Mesmo não tendo jogado nada contra o Ferrolho Porcino do Tricolor Suburbano, vamos ganhar tudo.
Flamém!
Porra, já tinha até tirado o blog dos favoritos… pensei q era o fim. Mas, enfim, o retorno triunfante! Que volte a regularidade das postagens, a Nação carece dessas palavras de fé.
Rumo à Tóquio! Hehe
SRN!
Muhlenberh de volta com a corda toda. E agora no Globo Esporte. Parabéns! Esse garoto vai longe!
E por falar em futebol: voltem logo com Dorival, antes que seja tarde demais.
Marinho de lateral esquerdo? Eu já vi este filme, estralado por outro português: Paulo Souza.
S.R.N.
Saudade! Escreve bem demais!!
Obrigado, Mayane. Igualmente.
Não foi por falta de aviso. Eu não me lembro da última vez em que o Flamengo caiu de quatro. O meio de campo precisa de um bom marcador. Com Tiago Maia e Gérson, o convite para a derrota será oferecido para todos.
Dorival urgente, antes que a vergonha seja maior.
SRN!
Porra, voltou inspirado!
Depois de uma longa hibernaçao, somos brindados com essa pérola.
Valeu!
SRN.
Mermão!
Tú tem cada idéia muito phodda!
Essa crônica não é o Fio, mas também é uma Maravilha!
Em Rabat o Real Madrid é obrigação, os gringo vai ver o que é bom prá tosse, graças ao Carioqueta!
O Mengão Malvadão é o sol que nos alumia…
Bom ! Cheio de amor, naturalmente.
MEEEEENGO!