Em novembro de 19, sob o entardecer de Lima, só havia uma dúvida pertinente no exato segundo em que o zagueiro argentino Javier Horacio Pinola, com rara amabilidade, ajeitou a bola de cabeça para o atacante Gabriel Barbosa solapar a rede: o sol poente iria mesmo seguir seu caminho por trás das montanhas ou explodiria naquele preciso instante?

O sol estremeceu mas aguentou firme, e foi aquela histeria coletiva que todos vimos, vivemos e protagonizamos – afinal, depois dali não tinha mais Grito da Independência, assinatura da Lei Áurea, tiro do Getúlio ou Guerra do Paraguai – Gabigol e seus companheiros escreveram no Estádio Monumental “U” o maior momento da História do nosso país, de longe.

Mas isso tudo vocês já leram e ouviram, de comentaristas mais sábios e vividos. O que este portal traz de novo é um furo de jornalismo, algo que nem a leitura labial do Fantástico foi capaz de levar ao torcedor. Contudo, após a análise de 217 câmeras, da rede BBC à TV Record (que na hora transmitia um exorcismo), nossa equipe de reportagem decifrou, transcreveu e publicou, com total exclusividade, como cada monstro sagrado desse time do Flamengo reagiu ao já chamado de gol do século – aos 46 minutos do segundo tempo, com Gabigol soterrado por Bruno Henrique e Vitinho e a terra em transe. A poucos minutos do sol se por em Lima.

DIEGO ALVES: “Gooooool, caceteeee. Ih rapaz, alguém segura ali o Julio Cesar que ele vai desmaiar… Avisei”

PABLO MARÍ: “La piedra inerte ni conoce la sombra ni la evita. Corazón interior no necesita la miel helada que la luna vierte… El autor es Garcia Lorca. Conoces, Rodrigo?”

GABIGOL: “Bom demais, galera!… Aí, acho que já deu, vocês estão há cinco minutos em cima de mim…”

VITINHO: “O Mister falou que é para ficarmos outros cinco aqui, para você não ser expulso. Ficaê, Bruno Henrique, firme!”

BRUNO HENRIQUE: “Rê rê rê, ê trem doido. Num gostô? Morde as costas.”

FILIPE LUÍS: “Everton! Chegou a reparar? No lançamento do Diego, a bola descreveu uma curva plana aberta perfeita, com uma simetria axial invejável. E que diretriz! De acordo com o livrinho que eu trouxe para ler no ônibus, Geometria Analítica vol. 3, o foco da parábola precisaria estar no…”

JORGE JESUS: “Quantos minuts faltam, queralho? Cincuuun? Ah, cincunn é meu punho cerrado no seu pacot, juiz parolo. Venha cá, Arão! Entra no lugar do Arrasca. Argh, tu não podes eintrar de novo. Vai pra lá, Arão! Chama o Piris, o pá!”

ARRASCA: “Tranquilo… Tranquilo, arf… Tranquilo, arf, arf (quase tendo um treco)”

RODINEI: “Aí Reinier, reparou que tem um U grandão ali em cima do estádio? Se amarra, vou fazer uma selfie e mandar pro Uribe.”

DIEGO RIBAS: “Velho acabado é a putaque… Calma, Diego, lembre-se do treino de mídia, coach training, respira. Melhor ensaiar: ‘Obrigado a toda a minha família e a quem acreditou em mim todo esse tempo, essa Nação é incrível e estamos realizando um velho sonho…’ Velho sonho, velho… Velho acabado é a putaquetepariu!”

GERSON: “Aquece, César. Sim, você. Esquenta que goleiro reserva em final da Libertadores só entra em ação nessas horas, se os argentinos vierem de graça. É tu que vai chegar ali primeiro para acalmar os ânimos, de preferência com uma voadora no peito do massagista. Vaaaapo!”

RAFINHA: Por fim, um impressionantemente calmo Rafinha desaparece das imagens. Por uma câmera exclusiva do estádio, vemos então o lateral-direito metendo um dedo no furico de um atacante argentino, correndo para dentro das salas do estádio, sapateando na mesa dos árbitros do VAR, dando cambalhotas na tribuna especial e correndo a jato de volta para o gramado, tudo isso sem tirar o dedo do furico do amigo do River. Ele então se aproxima da câmera e grita: “É Copa Libertadores, amigo!”