O Flamengo continua em sua célere, porém no sapato, arrancada rumo ao ENEA do Brasileiro. Domingo, todo bonito e jogando pro lado certo, o Flamengo de Renight destruiu o tricolor paulista, acabando com a esdrúxula escrita que já durava quatro anos sem ganhar daqueles putos.

Completão, com todos os titulares, menos o Isla, o Flamengo encontrou dificuldade pra se impor no começo do jogo. Os paulistas até que jogavam direitinho, atrapalhando legal, mas o grande inimigo do Flamengo era o gramado do Maraca. O histórico relvado, já tão castigado pelos arranca-tocos do Fluminense e os maus tratos promovidos pela inconveniente Copa América não permitia que os passes rubro-negros saíssem certos.

Infelizmente a regra é muito clara nesse ponto: times jogando em casa não podem reclamar do gramado. Causa até uma certa estranheza que o Departamento de Futebol do Flamengo não tenha como prioridade arrumar esse gramado. É uma ação muito mais necessária que contratar um meia armador do futebol europeu, seria um dinheiro mais bem gasto. Não faz sentido o clube investir pra trazer jogadores de alta qualidade técnica se não garantir a eles a mínima qualidade no instrumento de trabalho fornecido.

Mesmo com o Flamengo errando passe pra caramba e dando vários moles na defesa o primeiro tempo acabou sem maiores emoções além do educativo bate-boca entre Diego e Reinaldo. Os jogadores dos dois times foram pro vestiário se xingando com espontaneidade, mas sem usar palavras de baixo calão, foi bem bacana esse momento.

No segundo tempo os moles recorrentes na defesa cobraram seu tributo e os cara fizeram seu gol num cruzamento facilmente cortável para uma cabeçada igualmente defensável. Arrumar a defesa do Flamengo parece ser uma das tarefas mais sísificas da humanidade, arruma num jogo e desarruma no outro. É a prova de fogo pra reputação dos zagueiros e dos professores.

Pelo menos o professor Renight não tem o costume de ficar de braços cruzados ou com as mãos nos bolsos vendo o Flamengo se fuder. Renight deve ter cometido um monte de pecados na vida, mas dificilmente a inação estará entre eles. Científico, estudioso e sacudo, Renight leu o jogo e percebeu com clareza o que o Flamengo precisava naquele momento específico do jogo, — o seu talismã Michael. Com Michael em campo não tem placar em branco. Aceita ou surta.

Foi só Michael entrar em campo que tudo mudou imediatamente. Os passes que não estavam saindo começaram a chegar ao seu destino, os ataques foram se intensificando e as bolas, naturalmente entrando. Bruno Henrique fez a festa, exibindo seu vasto arsenal de finalizações, deixando três cocos no balaio do Volpi e mantendo a estonteante média do ataque do Flamengo de pedir uma música no Fantástico por semana.

Depois que o terceiro gol entrou o São Paulo só queria ir embora pra casa, mas o Flamengo foi extremamente indelicado com o convidado. Até o Gustavo Henrique, vejam vocês, fez gol nos caras. O que equivale dizer que o jogo tinha virado uma suruba e que ninguém era de ninguém. Preocupado em não servir de instrumento para a consagração definitiva de Michael, os são-paulinos deram um jeito de fazerem eles mesmos o quinto gol do Flamengo, que foi legal, mas um pouco anticlimático. Ficou faltando o gol do Renight.

Um jogo histórico, memorável e necessário que encerrou, ao menos por enquanto, os delírios da arco-íris sobre o desfecho do Brasileiro 2021. Ficou claro que é nóis e que depois de nóis é nóis de novo in saecula saeculorum. É uma lástima que no futuro tão poucos poderão dizer que estavam no estádio.

Quando estiverem contando aos seus filhos, netos ou bisnetos o que aconteceu nesse jogo não esqueçam de sublinhar que Bruno Henrique fez 4 gols e não apenas 3. Seu primeiro gol foi atrabiliariamente roubado, em mais uma tentativa de tornar efetivo o Grande Acordo Nacional para Fuder o Flamengo, com VAR, com tudo. Vai ajudar a narrativa e cativar os petizes.

Foi assim que os sonhos mais alucinados da pequena burguesia paulista foram frustrados pela meia dezena de gols da mulambada proleta do Flamengo. Deixando claro que o São Paulo está alguns patamares abaixo do Flamengo e que se não focar agora na fuga do rebaixamento a conta do Brasileiro pode vir muito cara em dezembro.

Diante da dura realidade restou ao São Paulo, ainda durante a aplicação do chocolate, apelar para a violência extracampo. Mas eles não se deram bem, além de perder na bola também levaro um pau. Até o médico do Flamengo tirou umas casquinhas. Cenas realmente lamentáveis que todos adoram.

Em resumo, foi um espetáculo completo, a comprovar que o Flamengo é atualmente o maior produtor de conteúdo da televisão brasileira. Entregando produtos de qualidade, que combinam aventura, drama, humor, emoção e violência em doses certas. Ser campeão de audiência implica em oferecer ao público aquilo que o público quer.

Nem precisamos falar do quanto é bom ganhar dos times de Piratininga. Não é bom só pelos três pontos ganhos. O ataque de perereca que a crônica esportiva da ponta feia da Dutra faz quando um time paulista leva uma pisa é muitas vezes mais legal que a própria vitória. Eles ficam descontrolados, perdem a linha e que se foda o legado de imparcialidade deixado por Cásper Líbero. Gostamos também.

Mérito do Flamengo, claro, mas também do seu metteur en scène. Renato, que se preparou por toda uma vida para ocupar o cargo dos seus sonhos, não tem conseguido errar. Os números de Renato Gaúcho em seu retorno ao Flamengo são impressionantes. Renight ultrapassou o recorde de Marcelo Fera de 2019 e atinge incríveis 100% de aproveitamento em seus primeiros quatro jogos como treinador. Além da porrada de gols que o Flamengo vem marcando sob seu comando, Renight tem conseguido modificar a vida dos torcedores, despertando até o seu lado religioso.

Entre os torcedores do Flamengo, até mesmo entre aqueles bem vestidos que professam o ateísmo, anda fazendo muito sucesso a singela oração:

01 do Monoteísmo
Não permita que o Flamengo lidere o Brasileiro
Antes da rodada 16

Amém

Mengão Sempre