Você partiu,
Saudades me deixou,
Eu chorei,
O nosso amor, foi uma chama,
O sopro do passado desfaz,
Agora é cinza,
Tudo acabado e nada mais!
Bide & Marçal
O Domingo 2 de setembro jamais será esquecido. Pena que a fuga do oblívio se dará pelos motivos errados. Poderia ser uma data festiva porque foi o dia de nascimento de Billy Preston, Giulliano Gemma, Salma Hayek e Carlos “El Pibe” Valderrama. Ou de lamento pela morte de Ho Chi Minh, do Barão de Coubertin ou do senhor de todos os anéis J.R.R. Tolkien. Mas o que vai nos fazer jamais esquecer esse 2 de setembro será a lembrança tremendamente desagradável do incêndio criminoso que vitimou o Museu Nacional na Quinta da Boa Vista, que foi apenas a segunda tragédia do domingo macabro.
A primeira tragédia foi a derrota feia, besta e idiota do Flamengo para o Ceará. Uma derrota desavergonhada, explícita, à luz do dia (jogos às 11 horas são um enorme erro), em pleno Maracanã lotado de crianças impúberes. Vou poupá-los de comentários sobre o jogo em si, além de desnecessários, seriam de muito mau gosto, porque vagabundo jogou nada e perderam merecido. O Flamengo jogar mal não chega a ser uma tragédia, aliás, depois que voltou do break da Copa, jogar mal tornou-se um hábito compartilhado por jovens e veteranos no Flamengo. A tragédia reside no fato de que a derrota pública para um dos poucos times já garantidos na Série B 2019 transformou em cinzas qualquer esperança de heptacomemorações em 2018.
O Museu Nacional ardeu e carbonizou 200 anos de pesquisa, violência colonialista e apropriação cultural. Perderam-se para todo o sempre múmias, esqueletos, coprólitos e bicabraques imperiais. O acervo perdido é insubstituível, mas a história do mundo nos conta que o fogo nem sempre é o fim. A Biblioteca de Alexandria também pegou fogo e mesmo sem os seus alegados 5 milhões de papiros a cultura helenistica encontrou uma maneira de influenciar o mundo ocidental (graças aos conquistadores muçulmanos e aos judeus letrados).
Londres, Roma, Chicago e San Francisco também foram consumidas pelas chamas e tão aí vivissimas, cidades globais, inclusive com filiais do CSI e do Starbucks. O Reichstag (parlamento em Berlim) também ardeu em 1933 e nem por isso a República de Weimar deixou de votar. É verdade que os alemão logo na primeira oportunidade que tiveram elegeram um ex-militar austríaco, preconceituoso e orgulhoso de sua obtusidade, mas a democracia germânica sobreviveu a esse mito. Quer dizer, em relação ao Museu Nacional podemos e devemos chorar o incalculável prejuízo, mas nem tudo está perdido. As cinzas do acervo queimado ainda podem servir para fertilizar o tipo certo de solo onde brotarão mais e melhores museus.
O que está irremediavelmente perdido, carbonizado, queimado e torrado é o ano de 2018 para o Flamengo. O torcedor rubro-negro, esse sábio que às vezes se disfarça de idiota para manter a palhaçada em níveis aceitáveis e pagar meia-entrada, já percebeu que esse ano foi pro ovo e que qualquer Copa do Brasil que nos caia do céu será insuficiente para mitigar a revolta provocada por mais um ano eleitoral jogado no lixo. Até agora o balanço é amplamente desfavorável para o Flamengo, em 18 só ganhamos mesmo a Tacinha Guanabarinha, que vale tanto quanto uma Taça Rio, ou seja, absolutamente porra nenhuma. Já colecionamos até o presente momento as desclassificações no Carioqueta, na Libertadores e agora, essa fraquejada-master no Brasileiro.
Fosse o Flamengo um clube pouca coisa mais sério e já teríamos tido uma sequência de golpes de estado, quarteladas e passeatas em protesto tumultuando o trânsito do Leblon à Lagoa-Barra. Por sorte é ano de eleição no clube e os 3 mil e poucos sócios que se animam a votar terão a chance de escolher, em nome de 40 milhões de viventes, alguém que, como pontificou o Príncipe de Falconeri, seja capaz de empreender no clube as grandes mudanças que farão com que tudo permaneça como está.
Para que essa letra não termine no baixo astral total de quem já não nutre qualquer esperança esportiva em 2018, aponto a coincidência de que o funesto 2 de setembro é também o dia de nascimento do icônico manager do Liverpool, Bill Shankly. Aquele que se imortalizou não pelas 15 temporadas à frente dos nossos fregueses de Anfield Road, mas pela definitiva explanação sobre o que realmente importa na vida das pessoas.
“Algumas pessoas acreditam que futebol é questão de vida ou morte. Fico muito decepcionado com essa atitude. Eu posso assegurar que futebol é muito, muito mais importante.”
Mengão Sempre
Karai – que silencio mortal. 😉
Hoje um dos jogos “importantes” e nem novo comentario tem. Falta salario ou somente saku?
A bagunça aqui no blog ta maior que a confusao geral na nossa defesa.
Arthur, belíssimo texto. Parabéns, camarada! Comecei a ler os comentários, mas parei logo assim que me deparei com o viés de direita. Como tem gente atrasada nesse Brasil!
Soh passar por cima desses comentarios – como se faz no dia-a-dia.
Ou vc se detem com adeptos do porconaro, por exemplo?
Alivie-se desse peso!
SRN
Nada a comentar sobre o futebol(?) do Flamengo que me dá engulhos. Só uma passadinha rápida para agradecer ao nosso Arthur a oportunidade de ver um lampejo de um dos melhores filmes que eu já vi: O leopardo (Il Gattopardo) de Luchino Visconti, 1963, se eu não me engano. Um filme além de grande filme, tinha no seu elenco as pessoas mais bonitas do mundo: Claudia Cardinale, Alain Delon e Burt Lancaster no papel inesquecível de Dom Fabrizio Salinas que muitos até hoje atribuem a frase famosa que você corretamente colocou na boca de seu verdadeiro autor, o Trancredi, o príncipe de Falconieri, interpretado por Alaín Delon, numa impecável atuação. Obrigado, Arthur, por esse momento de alegria tão raro neste Brasil e neste…atual Flamengo.