Ultimamente anda muito difícil praticar a humildade pra quem fecha com o certo. Não que não haja esforço e boa vontade de nossa parte. Mas além de não termos muita experiência na matéria ainda nos falta a motivação.
Naquele tempo em que a torcida do Flamengo se alimentava basicamente de lendas do passado glorioso e o pão fornecido pela Panificação Asmodeu, enquanto apoiava incondicionalmente times sórdidos formados basicamente por perebas, hematófagos e desajustados sociais, havia um propósito em abraçar a humildade. Que era não chamar a atenção para a ultrajante fragilidade de nossos esquadrões e assim não despertar a ira dos coléricos deuses do futebol, sabidamente intolerantes com fanfarronices que não se embasam no trabalho feito com a bola sobre o quadrilátero relvado.
Naqueles tempos de luta e pindaíba, quando o Flamengo travava suas batalhas no terreno movediço em torno do precipício que vai dar nas pestilentas divisões subalternas do futebol brasileiro, era imprescindível revestir com uma demão de razoabilidade as loucas previsões acerca de triunfos futuros de improvável realização que o torcedor rubro-negro, por dever de oficio, era obrigado a cometer na guerra das narrativas.
Daí que surgiu na torcida do Flamengo, desde sempre um parâmetro de desulmidade, soberba justificada e arrogância construtiva, uma espécie de culto clandestino, antinatural por certo, à humildade, à despretensão e ao baixo perfil. Um culto que podemos dizer herético, por tentar impingir à torcida características que contrariam frontalmente o ethos Flamengo.
Felizmente tal heresia jamais penetrou no coração do rubro-negro, servindo tão somente para o advento dos críticos de torcida, sempre alertas para censurar aos incautos que se deixassem empolgar antes das taças estarem solidamente cimentadas na Sala de Troféus da Gávea. Comportavam-se como verdadeiros inquisidores do Oba-Oba, defensores da fé pura e subserviente.
A torcida do Flamengo até desenvolveu uma série de superstições, mandingas e cacoetes vagamente relacionados à humildade, só para evitar a encheção de saco dos inquisidores. Mas jamais se deixou domar, jamais deixou de apostar suas cervejas nas vitórias e bebe-las por conta. O Oba-Oba, desde que se conheça e respeite a sua capacidade destruidora, é uma força da natureza tão poderosa quanto a cobiça ou a luxúria, que são forças absolutamente necessárias para qualquer conquista, seja esportiva ou não.
Hoje o Flamengo é outro e a sua torcida também não é mais a mesma. Desprezando a voz rouca e naturalmente keynesiana das arquibancadas o Flamengo abraçou com obstinação neoliberal o receituário econômico que o FMI recomenda a qualquer nação com as contas fudidas. Diminuiu despesas, cortou investimentos, arrochou o fisco e pagou as suas dívidas. Como acontece nos melhores países, antes de voltar a andar de cabeça erguida pelos bulevares da Europa, comprando, de preferência à vista, o melhor que sociedade de consumo coloca nas prateleiras, o Flamengo matou muito torcedor de fome.
Chegou a vez dos sobreviventes desfrutarem o benefícios conquistados com o sacrifício de tantos. O nosso patrimônio intangível continua o mesmo, o Manto, a bandeira, o hino, a torcida e as lendas. Só que agora nós também temos amplo acesso ao meio de pagamento para bens, serviços e força de trabalho emitido e controlado pelo governo. Estamos forrados de tutu como jamais estivemos, nem no tempo de José Bastos Padilha.
O Flamengo vai pras cabeças, é inevitável. Tem estrutura, tem elenco, tem estádio, tem bala na agulha e temos, no campo imaterial, a ambição, a cobiça e a fome sagrada por conquistas. Esse apetite foi demonstrado com eloquência no jogo contra o Ceará. O Flamengo jogou com seriedade, comprometimento e uma volúpia que foram a maior demonstração de respeito que se poderia dar ao adversário.
O Flamengo, com seu time tão cheio de craques que é preciso empilhá-los no banco de reservas porque em campo não cabem todos, deu um espetáculo, lutando até o ultimo minuto e brindando a todos com futebol bonito e três golaços de antologia. Como ser humilde? Mesmo sem querer é nosso dever comemorar uma vitória contundente que nos deixou, involuntariamente, na liderança do Brasileiro 22 rodadas antes da hora prevista.
Fazer o quê? O time que quer ser campeão tem que saber lidar com imprevistos. Já vimos que não dá pra confiar em cavalos paraguaios, que eles peidam mesmo. Cabe ao Flamengo segurar a marimba e atravessar as rodadas que faltam sob a artilharia pesada da arcoirizada sem vergonha e mal vestida que não consegue conceber um cenário pior que o Flamengo Heptacampeão Brasileiro em 2019. Nada que já não tenhamos feito antes.
Quem quiser ficar no sapatinho, esperar um momento mais propício pra detonar aquela caixa de canhão Caramuru 3 Tiros, tá tudo certo. A nossa diferença pro 2º colocado é de apenas ZERO PONTO e ainda faltam 22 rodadas pra acabar. Só vai dar mais um pouco de trabalho ficar no sapato porque a festa que já tá rolando está maravilhosa. Quem quiser empolgar que fique à vontade, empolga com força porque estamos cheios de motivos para isso.
O momento que estamos vivendo é o do despertar do apetite. A Copa Mickey, o Carioca, a Copa Brasil que dispensamos, foram apenas as entradas. A fome flamenga só será saciada em banquetes para 40 milhões de talheres, como o Brasileiro e a Libertadores. Não há mais razão para afetar humildade. Desde o começo cada rubro-negro sabia, em seu íntimo, que a tal humildade não era pro nosso bico. Primeiro porque ela nunca combinou com as nossas roupas de festa, sempre parecia que o defunto era maior. E segundo por que humildade é pros fracos e isso o Flamengo nunca foi. E nunca será.
P.S. Caraio! Que golaço do Arrascaeta.
Mengão Sempre
Não sei se eu estou enxergando coisas que não existem, mas achei que num pronunciamento de um dirigente lá deles, “quem não confiar não deve aparecer”, ou coisa semelhante, uma carga pesada de medo. Além do que é tanta falação, tipo “a derrota contra o Goiás não modifica nada” sem que lhes tenham perguntado nada que se o lado psicológico prevalecer os caras já estão derrotados.
Nós temos dinheiro em caixa, ótimo elenco e excelente técnico. Porém, não basta nada disso para alçarmos voos mais altos, se não tivermos um grande time. Por isso, necessária ainda uma boa dose de cautela, porque um grande time não se constrói da noite para o dia.
JJ, logo ao chegar no Flamengo, andou me preocupando. Houve partidas em que os jogadores pareciam perdidos dentro de campo. Um verdadeiro bando. Mas, aos poucos o time foi encorpando, tomando forma, assimilando as ideias e conceitos do português.
E, ontem, na vitória sobre o Ceará, eu vislumbrei o início da construção de um timaço. Nada com o placar, com a beleza do segundo gol ou com a mágica do terceiro. Contudo, com a expressiva apresentação coletiva do time. Exibição de gala, do goleiro ao ponta esquerda, como se dizia no passado. A inegável qualidade técnica dos jogadores começa a funcionar a favor do coletivo.
Entretanto, vamos continuar mantendo a humildade. Nada de muita euforia, pois sabemos que o Liverpool será um difícil adversário.
SRN!
O último parágrafo é sensacional !
Para atenuar a excessiva confiança, vou lembrar que o Inter, entre os possíveis adversários anteriores ao Liverpool, é o mais fraco, pelo menos para mim. Palmeiras/Grêmio e River/Boca são mais fortes.
Otimistas SRN
FLAMENGO SEMPRE
Nem me lembrei daquela perebada que vem da Nova Zelândia, México etc e tal.
Estes, a não ser que baixe o caboclo colorado/mineiro, não contam.
Concordo com você, meu amigo Carlos Morais. Realmente, creio ser o Internacional o mais fraco adversário que teremos pela frente na nossa caminhada ao bimundial.
Você bem sabe que fui um apaixonado turfista. Então, me especializei em estudar o retrospecto dos cavalinhos. Sabia quem gostava da grama pesada à areia leve; conhecia a filiação dos animais, dos bisavôs aos pais.
Ora, se estudar o retrospecto desse camisa, hoje eu seria um milionário. O azarão sempre aparecia para mandar os meus estudos para às favas.
Disse isso tudo, apenas para trazer aqui o retrospecto do Internacional, nas suas partidas após o reinício do Campeonato Brasileiro, ao encerramento da Copa América, sabendo que retrospecto não vale nada, nem no turfe e muito menos no futebol.
Foram 13 jogos, 7 pelo Brasileiro, 3 pela Copa do Brasil e 3 pela Libertadores, com 6 vitórias, 2 empates e 5 derrotas, aproveitamento de 51.2%. 10 gols a favor e 9 contra.
Dessas 6 vitórias, 3 foram no seu reduto esportivo, sendo 5 delas pelo apertado placar de 1 x 0 e a outra de 2 x 0 contra o mediano Nacional do Uruguai, o que, inegavelmente, demonstra a sua forma de jogar por uma bola.
E mais um detalhe a nosso favor: Marcelo Lomba está atravessando uma fase horrível, anda aceitando tudo.
Sem euforia, eu não acredito que o Internacional vença o Flamengo pelo placar de 2 gols ou mais. Pode até vencer por um gol, porque em futebol, de vez em quando, dá a zebra.
SRN!
Obs.: O Internacional jogou algumas partida com o time reserva ou com o time misto. Cansativo analisar jogo por jogo.
E que puta gol do Arrascaeta!
Puskas que Pariu!
Hahahahaha parabéns, Arthurzão Love, seu texto é uma delícia.
Meeeeeeennnnnnnggooooooo
Vou ser prático.
Um texto digno do incrível gol do De Arrascaeta.
Anestesiadas SRN
FLAMENGO SEMPRE
Eu tô aqui me esforçando em preces para ficar na humildade até o fim do ano. Mas jesus não deixa!
Arthur, dessa vez você passou dos limites. Não sei se por ressaca de emoções ou por preguiça mesmo, estou desprovido de argumentos para comentar o jogo. Então, vou dar uma de Dom Quixote e guerrear em uma batalha ilusória.
Cresci com a idéia de que os jogadores que envergam a camisa número 10 são os craques do time. Não entendo o porquê de a Diretoria do Flamengo não entregar a mítica camisa a seu mais digno representante.
O embusteiro e usurpador não tem mais espaço nesse time. A reserva de um Clube como o Flamengo – que eu me lembre – nunca teve a camisa 10 no banco de reservas.
A única associação com a camisa 14 é dos tempos de Cruyff. Craque holandês, totalmente fora dos padrões nacionais. Portanto, deem a camisa ao uruguaio. Lugar de enceradeira é escondido no armário.
De minha geração de torcedor. Zico, Pet, e, agora, Arrascaeta. Deixem a simbólica Camisa voltar a abrilhantar os estádios com talento e classe.
SRN.
Se a camisa 14 lembra Cruijf, lembra Holanda, que é a terra dos flamengos originais. Tem tudo a ver.
É verdade. Mas, prefiro a nacional. Essas lembranças de juventude não me saem da memória.
Nunca me dei conta desse detalhe. Taí a explicação pra minha paixão pela Holanda. Além, claro, do Bulldog, o 1º coffeeshop do mundo com cardápio de maconha e haxixe. País evoluído é outra coisa.
Por mais que, como você, não goste do ^estilo Diego de jogar^, considero, pelo momento que vive, uma maldade tirar a camisa 10 dele.
Por outro lado, em caso de medalhas, como todos esperamos, lembro à Diretoria que providencie uma para o tal Arroyo. O Equador é logo ali.
Arrascaetadas SRN
FLAMENGO SEMPRE
A prática da meditação leva espontaneamente a um estado de ser e estar em que os pensamentos, em vez de se atropelar como um filme de ação, vão perdendo a velocidade, revelando seu caráter repetitivo e sem criatividade até que percam o poder de influenciar a psique condicionando a pureza desses pensamentos. Essa compreensão é a meta de quem se dispõe e dedica a ir além das fronteiras e limites tanto do mecanismo corpo-mente quanto da estrutura material do próprio universo. O objetivo inconsciente – e muitas vezes secreto [não sei porque] – é ser e estar inteiro no presente momento sem que nenhum tipo de pensamento me desloque 1 milímetro que seja em outra direção. O impressionante poder do agora. E pra atingir esse estado, sentir esse poder, o autêntico poder inerente à espécie, qualquer meio ou recurso vale a pena.
Foi o que senti na hora do gol do Arrascaeta. Todo mundo no bar foi pego de surpresa. A explosão foi impressionante. Foi em dobro: pelo gol e pela arte pura, onde o pensamento não tem espaço, ocupado por um nível de consciência dominado pela intuição, autoconfiança e serenidade de um psicopata – eu, se não fosse flamenguista, teria medo do Arrascaeta; ele é muito sinistro.
Quando me dei conta, me senti literalmente fora do chão, numa espécie de dança espontânea que contaminou a todos e o que mais se ouvia era: “o que foi isso, maluco?” Isso é meditação no market place. O Agora se impondo.
Esses caras, todas as novas contratações feitas este ano, estão se pagando. Tá realmente começando a dar gosto ver esse time jogar. Eu, que tenho sido um corneteiro e reclamão contumaz dos professores passados e da coleção de perebas manchando o manto, me rendo com alívio e admiração ao JJ e à diretoria, nomeadamente Marcos Bráz e Bruno Spindel.
Deixa eu curtir enquanto posso.
srn p&a
Liverpool não dorme faz 10 dias.
Arrascaeta é quase um psicopata. Seu desprezo às emoções e a total falta de empatia com os sentimentos adversários, são comoventes. Até que a bola chegue a ele, parece estar flutuando num universo paralelo onde marcar o inimigo não faz parte do cardápio, ‘recomposição’ é uma palavra que ainda não conseguiu traduzir e muito menos entender. Não foi pra isso que se dispôs a ser um canal de genialidades com a bola nos pés. Como dizia e fazia o próprio Zico, “deixa que eu marco por ele”. É se fazendo de morto que os do lado de lá o deixaram sozinho pra receber o passe do Rafinha, ter tempo de calcular a velocidade e altura da bola, concluir que era melhor virar discostas e sapecar uma Harley&Davidson (bicicleta e pra pobre) 900 cl. nas redes do Ceará no mesmo lugar onde o Pet fez o Helton sentir o vento na ponta dos dedos.
srn p&a
Tá difícil ser humilde quando até o Berrío dá passe de peito pra gol e, não satisfeito, pra confirmar, engana todo mundo, incluindo seus coleguinhas, e, em vez de cruzar na frente da meta adversária como manda o protocolo, toca pra trás com fita métrica e velocidade controlada na canhota do Gabriel. Embora sejam mais secretos que corrupção no andar de cima, tudo leva a crer que os treinos do JJ são muito foda. O gol do Marí, em brilhante jogada ensaiada, não deixa dúvida. Aliás, que zagueiraço! Téquinfim encontramos a zaga ideal. De qualquer maneira vou me esforçar pra manter o sapatinho pelo menos até 4ª feira. Mas do jeito que a evolução é visível, o encaixe sem arestas parece não se alterar com a mudança de peças aqui e ali, fica difícil conter a empolgação. Se não o Oba-Oba, cabe um Oba solitário e um sorriso contido.
srn p&a
Esse Berrio é uma comédia. Não deu nem tempo de o mandar para aquele lugar. O sujeito perde um gol facílimo e prontamente emenda dois passes para os gols. Vai entender…
Depois do mítico drible contra o Botafogo que, além de tudo, se transformou numa coisa rara, talvez única – assistência para um gol de Diego em jogo grande decisivo (ainda que ele tenha feito de tudo para perder, chutando 90% chão e 10% bola) – nunca mais critiquei o Berrío.
Além do que, o cara é campeão da Libertadores. Tem que respeitar.
Este é um momento interessante da temporada, quando o flamengo começa a demonstrar que pode e quer ser campeão. Isso gera um oba obismo (tradicional) por parte de seu torcedor e um silêncio sepulcral do outro lado. Incrível como os antis retrairam-se nas redes sociais e também nas ruas.
Arrhur, você é um gênio. Hahaha
Seus textos são um deleite para um rubro-negro transbordando de soberba e felicidade.
Obs: Queremos o mundo de novo.
to praticando essa humildade e só comemoro dentro de casa…. por enquanto!!!!!
Arthur, deixa de ser preguiçoso e escreva. Sobre o Gol do Arraxxxxxcaaaaaaaa!