Antigamente, um período histórico de limites fluidos que se estende desde quando seis jovens remadores, blá-blá-blá, e a primeira década do presente século, o Flamengo só ia a Porto Alegre pra levar surras vergonhosas. Era um calvário, o Flamengo cruzava o Mampituba e virava a putinha dos meridionais. Ainda bem que esse tempo de humilhação, resiliência e sofrimento não compartilhado, em que até Juventudes e Caxias tomavam nosso lugar de fala, estão definitivamente encerrados.

Hoje em dia é tudo muito diferente. Quando o Flamengo visita as províncias surrupiadas d’El Rey o faz como um conquistador coletando os tributos a ele devidos. Para o Flamengo educação sempre foi prioridade, e como todo bom educador, o Flamengo aprende ensinando. Jogo após jogo, ano após ano, o Mengão, na base da chinelada didática, foi domando e amansando os chucros clubes gaúchos.

Grêmio e Internacional, depois de tantas e tantas lições de disciplina, finalmente aprenderam a perder do Flamengo em casa como homenzinhos, sem muitos chiliques. Especialização que é atualmente, para se dizer o mínimo, uma obrigatoriedade para quem atua no mercado do futebol profissional brasileiro.

Não é nenhum quintacolunismo admitir que o empate com o líder provisório jogando como visitante pela 18ª rodada ficou bem aquém do que se poderia esperar do nosso time misto. A imensa categoria de alguns dos nossos craques, evitarei a citação nominal para não ter que escrever o nome do Pedro dez ou onze vezes no mesmo texto, não é algo que se aprenda ou se transmita através de treinamentos. Ou seja, nem todo mundo que aparece no gramado com a roupa de jogador do Flamengo é um abençoado pelos deuses da bola. Sempre será um sortudo, mas não necessariamente um favorito dos deuses.

Alguns compensam o que falta em talento com suor, outros com obediência tática, um outro é super gente boa, o outro é a alegria da resenha, e por aí vai, assim são os elencos. O Flamengo nunca teve um elenco tão qualificado, com tanta gente boa de bola. Mas mesmo assim, na hora em que vão bater time pra jogar o rachão alguns são escolhidos antes dos outros. Por isso é importante ressaltar, sempre que for necessário frente a algum colorado se jactando da proeza de empatar com o Flamengo em casa, que o time do Flamengo que jogou era apenas o time misto e que parem de frescagens.

Mesmo sendo misto o time do Flamengo criou 4 excelentes oportunidades ofensivas, todas elas convertidas pelos atacantes. Pena que duas delas foram convertidas por atacantes do Internacional, correndo pro abraço depois de receberem assistências incríveis de Isla e Gustavo Henrique. Esses gols gentilmente ofertados pelo visitante não foram suficientes para aplacar os temores norte uruguaios, que pra garantir o empate espúrio ainda nos afanaram dois pênaltis escandalosos. O que até nos tranquiliza, pois como s sabe, quando o Flamengo está sendo roubado é porque as instituições democráticas nacionais estão funcionando normalmente.

Durante a partida era evidente o júbilo dos sem drenagem com o placar parcial. Felizes como meninos abrindo seus presentes de Natal, seus jogadores, treinador, e até dirigentes, contribuíram para criar um clima artificial de grande rivalidade. Do banco do Flamengo, onde reinava um clima de moderação e sobriedade, só se ouviam palavras de incentivo e instruções táticas. Já no indócil banco do Inter, dedo no cu e gritaria.  Quando o jogo acabou os semdrenagem estavam radiantes.

Reconhecer o valor dos adversários é uma característica comum às grandes equipes. Todo rubro-negro com alguma vergonha na cara não hesita em admitir que a Taça Empatei com o Flamengo deveria ter sido entregue ao Internacional ainda sobre o relvado. Eles realmente se esforçaram e mereceram o laurel. Não importa se não foram os primeiros, depois eles que se entendessem com o Bragantino, o Botafogo e o Palmeiras. Deixo aqui o meu desabafo.

O Flamengo podia, e até deveria, ter ganho dos cara lá, mostrou que tem bola de sobra pra isso. Mas não ter vencido mesmo depois de demonstrar evidente superioridade técnica, tática e moral, não nos causou qualquer dano. Na verdade fez até bem, esse negócio de liderança antes da 38ª rodada continua passando aos torcedores mais religiosos uma perturbadora impressão pecaminosa. Agora sem Jesus no fechamento talvez seja melhor o Flamengo seguir a liturgia.

No quesito etiqueta e bons modos o time do Domènec supera o do Míster, que afoitamente assumiu a liderança na 16a rodada, uma pressa de gosto muito discutível. Dome, provavelmente por ter trabalhado em clubes mais dominantes, entende melhor a agenda de costumes adequada ao do Flamengo e tem consciência da importância de ficar sapato o maior tempo possível em competições tão longas. Por isso evita alcançar o ultimo patamar da tabela antes de la hora buena.

Mas se todo desfalcado, jogando um futebol feio e com um treinador ruim o Flamengo só espalha dor, humilhação e desespero por onde passa, imaginem do que será capaz de fazer quando tiver todos os seus craques à disposição do treinador, lutando encarniçadamente para arrumar uma vaguinha no onze titular. Quando isso finalmente acontecer o nível técnico até das rodas de bobinho no treinos no Ninho Urubu será superior ao dos jogos do Brasileiro. O que também não chegará a ser uma façanha técnica.

Falando em treino, o vate paraibano Bráulio Tavares resumiu magistralmente o momento tático do Flamengo. No domingo, pelo Twitter, Bráulio nos advertiu que o Flamengo não tem tido tempo para treinar, por isso tem treinado no primeiro tempo dos jogos, deixando pra jogar só no segundo tempo. E concluiu, com ampla anuência das massas conectadas, que tem sido mais do que suficiente.

Faltam 10 pontos. Rumo a Tóquio é o nosso way of life.

Mengão Sempre