Escolho meus amigos não pela pele, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. Bruno Lucena tinha a pupila rubro-negra.
Na última vez em que estive com ele, estávamos tomando um chope no Lamas. Ele contava que tinha acabado de fazer sua mudança para um apê na rua Paissandu, no Flamengo. Não era só a pupila. Mas a pele, o corpo, a alma.
Bruno chega ao céu rubro-negro carregando uma taça reluzente. Mais uma entre tantas que ele lutou para preservar. Cuidava delas com amor infindo, ardentemente com denodo e fé.
Aposto que foi recebido lá em cima pelo primeiro goleiro profissional do Flamengo. Contou para nosso eterno Fernandinho sobre Ceni e Hugo. Uma conversa intensa sobre sair do gol, montar barreiras, escalar o time, essas coisas. Estava eufórico pelo Octa. Acabou antecipando a partida. Me consola saber que sua morte não foi uma passagem, mas, uma jogada. E entrou lá campeão.
Amar o Flamengo até se consumar o tempo da gente. É nisso que penso quando vejo o estádio vazio. Quando o grito de gol é da janela e não da arquibancada. Quando choro a dor de tantas vidas interrompidas pelo vírus devastador. Bruno era um torcedor-memória. Um homem-flamengo. Ele entendia de rupturas e continuidades. Sabia tudo sobre resistir para preservar o passado e compreender o presente.
Agora ele está lá, e sei que já esbarrou com o Dida. Não foi um encontro qualquer. Bruno chegou lá com uma caneta e um caderninho para pedir autógrafos. Bruno também ouviu alguém assoviando, e foi confirmar. Era o Geraldo. O mesmo controle de bola, visão de jogo e futebol alegre. Coisas do céu rubro-negro.
Bruno subiu para contar as histórias daqui. E continuar a sentir o Flamengo com a intensidade e a entrega que viveu. Que vivemos. Quando tudo passar, e se Zico quiser, nós passarmos por tudo isso, vou precisar recolher todo o sentimento rubro-negro e depositar no corpo outra vez. Isso acontece uma vez ou outra.
Certa vez, faz tempo, o Bruno sumiu. Os amigos se mobilizaram. Foi uma comoção. Meu coração estava tranquilo. Sabia que era só um drible na gente. Mas a coisa toda foi muito angustiante. Até que ele reapareceu. Explicou para todos nós o motivo de ter ficado incomunicável, e a vida seguiu.
Reencontrei com ele na exposição “Flamengo, História de uma paixão” e ele me pôs a par de todos os detalhes, os bastidores e as minúcias sobre as fotos, as preciosidades, sobre respirar Flamengo. Foi uma honra tê-lo por perto. Acompanhar seu trabalho, suas pesquisas. Ver seu olhar doce e gentil pelo Patrimônio Histórico do Flamengo. É bonita demais essa gente que cuida das nossas coisas. Que conta as nossas histórias. Que preserva nossa memória.
Bruno agora está lá com Coutinho também. Falaram sobre Jesus, claro. Os dois. Dessa vez Bruno não vai mais reaparecer, mas entra definitivamente para a história do Clube de Regatas do Flamengo, que agora é eterna para ele.
Bruno reconheceu um sobrenome por lá: Mariano. Ele encontrou meu pai e entregou para ele a taça de Octacampeão Brasileiro, a meu pedido, com um bilhetinho: “Um dia te explico, saudades.”
Obrigada pela gentileza, Lucena, por amar tanto o Flamengo. Descansa em paz no céu rubro-negro. Por você, e pelos 255 mil mortos pelo novo coronavírus no país: todo o meu sentimento. Vai passar. Não é uma gripezinha. Usem máscaras. Evitem aglomerações até podermos lotar o Maraca de novo.
Para vocês,
Paz, Amor e Vacina.
Bonito demais o seu texto Vivi!
Bruno: amigo leal, guri sapeca, divertido e pessoa dinâmica, com vontade de fazer tudo pra ontem!!!
Ele se foi, mas nos deixou à alguns o grande presentão de ter vivido com ele alguns momentos lindos e inesquecíveis.
Obrigada Bruno…
Fica com Deus.
Texto emocionante e que traduz o sentimento de quem o conhecia bem.
O CRF perde um dos grandes! Dedicado e estudioso do rubro-negrismo. Amigo e parceiro de projetos.
A alguns anos estive na Gávea e ele me chamou para ver o trabalho que estava fazendo no ainda em construção Museu do Flamengo. Foi uma surpresa incrível! Todos aqueles troféus e itens catalogados um a um com um carinho e atenção ímpar.
No meio de tudo aquilo ele era um garoto torcedor e historiador ao mesmo tempo.
Fico por aqui.
Você já faz falta amigo.
Receba meu abraço.
Viviane,
Parabéns pela homenagem ao Bruno. Lindo texto!
Saudações rubro-negras
Léo
Ué, meu comentário não saiu !
Fiz comentários no Arthur, no Murtinho e aqui.
Só este não foi publicado.
Será que esqueci de apertar o botão do “Enviar” ?
Era tanta emoção que nem duvido da possibilidade.
De qualquer maneira, um registro.
Emocionante, dqueles que fazem um cisco cair nos olhos.
Enebriadas SRN
FLAMENGO SEMPRE
Querida VIVI:
Quão emocionante este seu texto sobre Bruno Lucena.
Cada dia fico mais seu fã, desde o dia em que nos encontramos pela primeira vez em uma reunião sobre Eleições no Flamengo.
Beijos e muita saúde!
Saudações rubro-negras
Não tenho muito o que comentar, só dizer que caiu um cisco enorme aqui nos olhos…
Pelo que li me pareceu pessoa altamente competente e muito querida, coisas raras atualmente. Como perde joias raras esse Flamengo…
Grande perda do Flamengo. Indescritível perda pra quem era seu amigo.
O sumiço assustou, mas passou. Essa notícia de sábado doeu fundo. Memória de muitas situações vividas com ele. A mesma memória onde ele ficará guardado eternamente, carinhosamente.