Outro dia um meninote chegou do colégio, muito sério, largou a merendeira e jogou no colo do pai uma daquelas perguntas desconcertantes: “Paiê, onde nasceu Jesus?” O pai, agnóstico, cofiou a barba, ciente das aulinhas de religião, e começou a tecer considerações sobre Belém, os estábulos e manjedouras da cidade palestina, a Galileia, e quando já entrava pelo lago Tiberíades, onde teria se dado a multiplicação dos peixes, o pimpolho o interrompeu: “Mas pai… Então a Palestina fica em Portugal?”
Pois é, não tem quem não pense em Flamengo por estes dias, nos lares, escolas, igrejas e bares (especialmente nos bares). O que é absolutamente natural, ainda mais após as cenas de carinho e devoção antes da decolagem do voo 9381 rumo a Lima, com mister Jorge Jesus e nossos rapazes a bordo.
O ser humano tem, porém, a mania inevitável de achar que os tempos em que vive são mais especiais que outros, apenas por acontecerem logo ali sob sua presença, como bem reparou Luis Fernando Verissimo no seu livro de frases “Verissimas”. Por isso, irmãos flamengos e distintas flamengas, peço que relaxem. Estamos apenas às vésperas de mais um 23 de Novembro – data acostumada com o Flamengo.
A seguir, uma breve e mal-ajambrada lista de outros momentos memoráveis da história rubro-negra que, não por acaso, caíram num dia 23 do 11º mês do calendário.
* 23 de Novembro de 1896
Era um Rio de Janeiro tão antigo que não existia chope, samba ou cariocas na praia, e as cores vermelha e preta nem haviam sido inventadas. O Flamengo era amarelo ouro e azul, uma combinação que desbotava, encarecia a importação dos tecidos da Inglaterra e, de quebra, poderia provocar confusões num futuro Fla x Boca Juniors. Para piorar, os remadores do Mengo não venciam uma, e os ímpios já nos chamavam de “Clube de Bronze”, pela constância de terceiros lugares nas raias. Até que o sábio Nestor de Barros espiou, segundo consta, uma linda bandeira do Jockey Clube Brasileiro e propôs a mudança. No dia 23 de novembro de 1896, as cores foram oficialmente alteradas para preto e vermelho e o Brasil ficou muito, mas muito mais bonito.
* 23 de Novembro de 1941
O estádio da Gávea estalava, novíssimo – bem diferente dos estalos atuais, de um concreto que implora por reforma naquelas arquibas sagradas. Flamengo e Fluminense decidiam o Campeonato Carioca diante de 15 mil torcedores, e o escrete rubro-negro precisava de uma valente vitória contra os então campeões do Rio. O tricolor meteu 2 a coco e ficou se achando – e o castigo já vinha a cavalo. Pirilo empatou aos 39 minutos e os visitantes, se borrando, decidiram isolar a bola na Lagoa, que ficava do lado do campo. Renganeshi, defensor tricolor, era quem chutava mais longe, mas o líder dos borrados era o atacante Carreiro, que chegou a rasgar sua própria camisa para cavar uma penalidade e acabou expulso. Como só havia uma bola por jogo, o árbitro Juca da Praia (devidamente xingado por minha saudosa avó, do que muito me orgulho) terminou o jogo sem dar os acréscimos devidos. Mas o resultado foi uma bênção: o elenco do Flamengo, indignado com aqueles covardes ataques às garças por parte do Fluminense, conquistou a partir do ano seguinte o primeiro Tri do Mengão. Em tempo: o artilheiro Leônidas não pôde jogar por conta de uma detenção do exército brasileiro, o que mostra do que nossos militares são capazes.
* 23 de Novembro de 1955
Foi no dia 26 de novembro que Nelson Rodrigues publicou, pela “Manchete Esportiva”, a crônica da bastilha inexpugnável, até hoje o mais lindo texto rubro-negro que não se pode cantar. Quem garante que ele não o escreveu ou enviou para a gráfica no dia 23 de Novembro? (Com a palavra, o biógrafo de Nelson, Ruy Castro, que lança livro em breve em Ipanema, onde vocês podem ir lá chateá-lo com perguntas como essas. Contanto que comprem o livro).
* 23 de Novembro de 1981
Foi numa segunda-feira. No vestiário no Uruguai, antes do terceiro jogo da decisão, Junior pediu a palavra e deu o pai de todos os conselhos, referindo-se ao tumultuado jogo no Chile: “Agora é esquecer tudo o que aconteceu, e vamos jogar futebol!”. Resultado: Flamengo 2 a 0 no Cobreloa, e a Taça Libertadores da América nas vitrines da Gávea.
* 23 de Novembro de 2009
Qual teria sido o jogo mais importante do Hexa em 2009, querido leitor? Não, não fale besteira. O principal foi este, Flamengo x Goiás no Maracanã. Sim, o zero a zero dramático, diante daquela torcida toda no Mario Filho. O resultado, eu sei, não foi dos melhores. Palmeiras e São Paulo se seguraram na tabela, o zagueirão Ronaldo Angelim saiu falando em “mala branca” para o time goiano, no valor de 300 mil reais. O que ninguém percebeu foi o seguinte: o Goiás saiu galudão do Maracanã, e graças àquele empate foi confiante para ferrar bonitinho o então líder São Paulo, na rodada seguinte no Serra Dourada – este sim, o resultado mais difícil e comemorado de 2009, ainda mais difícil que a belíssima vitória do Botafogo, de virada, contra o tricolor paulista no Engenhão – naquele mesmo dia 23 de Novembro, por sinal.
* 23 de Novembro de 2019
Que todos tenhamos apenas o mais feliz e inesquecível de todos os 23 de Novembros até hoje. Aguenta, coração!
agora são uma e meia da manhã e nada de sono…..
SRN !
Estou trabalhando , vou largar serviço de manhã, aí vou ainda fazer um troço no Uber e depois descansar um pouco que ninguém é de ferro, assim a hora vai passar e quando chegar o momento de torcer, acreditar e gritar: SOMOS CAMPEÕES DA LIBERTADORES DA AMÉRICA.
Aos secadores , só lamento por não terem o Flamengo no coração e na alma.
Como é ótimo ser flamenguista e saber que temos uma nação que ama e segue religiosamente o Flamengo assim como eu.
É amanhã, galera fechada com o certo, é amanhã!!!!
Agueeeeeeenta coração
Mais uma antológica. Que 23 de novembro de 2019 seja a data das nossas vidas
O dia da “revelação” das nossas cores.
Vamos trazer essa taça Mengão!!!!
Ninguém dorme!!!!!!
Ninguém dorme!
Boa, Dunlop! Eu tava nesse 23 de novembro de 2009 e, ao contrário de boa parte dos Rubro-Negros, saí do Maraca ainda confiante no hexa, por causa justamente dessa ajuda do buátafogo.
Rumo ai bi!
SRN