Mais um jogo, mais 3 pontos, mais um coitado que o Flamengo atropela e deixa agonizando na vala sem prestar socorros. O Fla-Flu, desde o apito inicial, foi de uma previsibilidade atroz. O Flamengo entrou com fome habitual e antes do Miojo ficar pronto Bruno Henrique já tinha deixado o dele nas redes dos réprobos tricolores foragidos da Série B.

Apesar de ser apenas o primeiro Fla-Flu de Jesus o Flamengo tratou o clássico interdivisional com a maior das seriedades. Mesmo com o rodízio de alguns titulares o time não pareceu estar guardando nada para quarta-feira. Flamengo foi todo pra frente, brigando por todas as bolas, não deixaram nada na mesa. O Flor pouco pode fazer além de lutar para não ser esculachado. Os escassos tricolores que botaram a cara devem ter saído satisfeitos do Maraca. Apanharam de muito pouco. Bem, talvez nem todos.

Se no Maracanã chegasse um ET mal informado, que não conhecesse os respectivos passados dos clubes que se enfrentavam, poderia até achar que era o Flamengo que estava com o pai na forca, lutando contra o rebaixamento. O goleiro do nosso coirmão esquisitão trabalhou como um condenado, o que não justifica uma ligeira imperícia nas nossas finalizações, mas explica o Flamengo não ter sido capaz de meter os seus três gols de praxe.

Soa repetitivo, mas é importante que se diga que mais uma vez o Flamengo foi roubado na maior cara de pau. O pênalti escandalosamente não marcado sobre Gabriel foi só mais uma prova de que a solerte CBF, para tentar desonestamente equilibrar a competição que organiza, está usando o poder discricionário dos árbitros que escala nos jogos do Flamengo e do seu VAR cheio de gambiarras, para ajudar a qualquer um que possa atrasar o fim precoce do campeonato e atrapalhar um pouquinho a marcha acelerada e triunfante do rubro-negro rumo ao título.

Mas tais percalços só aumentam a glória rubro-negra. Dá o maior orgulho ao torcedor saber que em sua jornada rumo ao Heptacampeonato o Flamengo já não está mais enfrentando os outros 19 times do campeonato. O Flamengo enfrenta todo o atrasado sistema confederativo. Que é o que mantém o futebol brasileiro prisioneiro das falcatruas, mero exportador de matéria prima sem valor agregado. É justamente por isso que nós, rubro-negros, dizemos que somos fechados com o certo.

Sei que agora não adianta porra nenhuma reclamar, é jogo jogado. Mas é bom que o clube sempre marque sua posição oficialmente. Sem os faniquitos embaraçosos protagonizados pelos cartolas arcoiristas, claro, mas sempre dizendo a real. No futuro alguém há de pesquisar o que aconteceu em 2019 e é reconfortante saber que estará escrito em algum lugar que o Flamengo foi roubado e não ficou quieto, que ao menos denunciou o mal que lhe fizeram. É o mínimo que o clube deve fazer pelas futuras gerações. Ser um clube cidadão implica em denunciar as iniquidades, mesmo quando as mesmas não são capazes de nos atingir. Ser Flamengo é pensar grande e à frente.

E se tem um cara que pensa grande, que obviamente já era Flamengo e ainda não sabia, é o nosso Jorge Jesus. O portuga é muito fominha, não quer deixar nada pra ninguém, não se conforma com pouco. Aliás, nem com muito. Com Jesus não tem miséria, ele queima tudo até a última ponta. Não recua o time, não poupa jogadores, dá esporro em geral, não acredita em descanso, porque sequer admite o cansaço entre seus comandados.

Às vésperas do jogo mais importante das nossas vidas o Mister poderia muito bem estar fazendo o que os profeçores brasileiros adoram fazer: empurrando o Brasileiro com a barriga, escalando os come e dorme do seu fechamento e apostando todas as suas fichas no mata-mata onde a culpa por fracassos se divide com o acaso e com a imponderabilidade. Mas Jesus não quer nem saber, escala sempre o melhor time possível e manda partir pra cima sem medo. Podia se contentar em ter um time bom, mas exige tudo dos caras e provavelmente não se satisfará nem com um time ótimo.

A postura insaciável de Jesus faz lembrar o General Curtis LeMay, o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea dos Estados Unidos nos anos 50. No auge da Guerra Fria LeMay compareceu diante um comitê do Senado americano pra pedir dinheiro para 10 mil ogivas nucleares para a Força Aérea. Um dos senadores, Everett Dickersen, um republicano anticomunista raiz, respondeu que LeMay já havia dito anteriormente que com 6 mil ogivas nucleares ele reduziria a União Soviética a cinzas. Por que o Senado deveria lhe dar agora 10 mil ogivas? LeMay respondeu epicamente: – Senador, eu quero ver as cinzas dançarem.

É muito bom saber que com um psicopata obcecado por vitórias desse naipe no comando do Flamengo não há sequer espaço para que se defenda no clube uma posição mais cautelosa. Mesmo que o Flamengo passe à final da Libertadores é certo que Jesus não vai dar refresco pra ninguém. Vai jogar sempre com os titulares e exigir ganhar todos os 11 jogos do Brasileiro até a 38ª rodada amparado na sua frase mais emblemática e verdadeira: – Ainda não ganhamos nada.

É bastante irregular, invulgar e inusual, para alguns é até blasfemo, que enquanto ainda faltam 11 jogos pro fim do campeonato alguém tenha o desplante de já se considerar campeão. Ainda mais os rubro-negros, famosos por sua contenção e pragmatismo. Mas quem está vendo os jogos, não apenas os espetáculos feéricos apresentados pelo Flamengo, mas também as tristes peladas dos adversários que nos perseguem à longa, longuíssima, distância, tem a certeza tranquila (ou raivosa) que esse Brasileiro já foi pro saco. E que esse saco fica lá na Sala de Troféus da Gávea Sinistra.

Salvo a ocorrência de algum megaevento a nível de extinção não programado (chuva de meteoros venenosos, terremoto nível 10 na Escala Richter com epicentro na Pavuna, colisão surpresa com cometa em rota errática, ataque alienígena em feriado), não tem mais como o Flamengo perder esse Brasileiro.

Quase todo mundo na torcida do Flamengo já sabe disso, mas tem prudentemente segurado a onda em respeito às vítimas dos atropelamentos pregressos e para não perder o foco da Semifinal do Fim do Mundo da quarta-feira. Quem tiver com pressa já pode ir comemorando, tá liberado. O Heptacampeonato do Flamengo não é mais uma questão de como e sim de quando.

Mengão Sempre