(Se você não entender o porquê desse texto agora, quase um mês depois do jogo, dá um confere no post “Criando coragem”, publicado em 26 de março.)
Libertadores, 1ª rodada da fase de grupos.
Situado a 3.750 metros de altitude, na cidade boliviana de Oruro, o Estádio Jesús Bermúdez foi, em 20 de fevereiro de 2013, cenário de uma das mais tristes histórias recentes envolvendo torcedores de um grande clube do futebol brasileiro. Durante o jogo entre San José e Corinthians, um sinalizador marítimo disparado por um dos integrantes da torcida corintiana atingiu e matou o menino Kevin Espada, de 14 anos. Felizmente, a partida entre San José e Flamengo, abrindo a participação dos nossos clubes na fase de grupos da Libertadores 2019, transcorreu em paz.
Comecemos pelo óbvio.
Para quem não é local, jogar futebol a mais de 2.500 metros de altitude é uma tortura. Entretanto, a opção pela obviedade não é gratuita: após a partida, alguns comentaristas disseram que o Flamengo deveria ter sido mais compacto, que a receita é agrupar os jogadores, trocar passes curtos e manter a posse de bola, de preferência no ataque.
Como se fosse fácil. Como se esse mesmo San José não tivesse, em 2008, vencido o Santos em Oruro por dois a um, para depois tomar uma chapuletada de sete a zero na Vila Belmiro. Como se o Jorge Wilstermann não tivesse, nas quartas de final da Libertadores 2017, derrotado o River Plate por três a zero em Cochabamba, a 2.560 metros de altitude, para na semana seguinte ser eliminado, em Buenos Aires, pelo humilhante placar de oito a zero. Como se não tivesse sido nos 3.660 metros de La Paz que a Argentina de Messi, Tévez e Mascherano levou um sapeca de seis a um nas eliminatórias para a Copa do Mundo de 2010. (Didi Torrico e Saucedo, que enfrentaram o Flamengo, estavam em campo.) Gostaria que os comentaristas explicassem por que o Santos, o River Plate e a seleção argentina não foram mais compactos, não agruparam seus jogadores, não trocaram passes curtos e não mantiveram a posse de bola no ataque.
Afirmar que o Flamengo vem tendo, no início da temporada, um desempenho bem abaixo do que seria razoável esperar, é uma coisa. Querer que o Flamengo tivesse feito a quase 4 mil metros de altitude o que ninguém consegue, é outra.
Quando enfrenta adversários desacostumados ao ar rarefeito, o San José faz o simples: chuta. De qualquer jeito e de todo lugar. A bola ganha velocidade, descai de repente, a vida dos goleiros vira um inferno. Por outro lado, a estratégia oferece, a um goleiro bem preparado e atento, a chance de brilhar. Foi o que aconteceu com Diego Alves. Fez mais de meia dúzia de defesas enjoadas, mesmo tendo à sua frente uma grande atuação da dupla de zaga formada por Léo Duarte e Rodrigo Caio.
Bruno Henrique foi o destaque ofensivo, Gabriel teve classe e frieza para marcar o gol da vitória, Cuéllar lutou feito um leão, Willian Arão jogou sério e sem cochilar, Everton Ribeiro arrumou o time no segundo tempo, ao entrar no intervalo em substituição a Arrascaeta. Fez o que a torcida tem exigido de Diego: movimentou-se, procurou o jogo, apareceu em todos os lados do campo, driblou, passou, alternou velocidade e calmaria nos momentos certos.
Em partidas difíceis de jogar por fatores especiais – campo esburacado, chuva forte, altitude, etc. – o desempenho perde importância e o que vale é levar os três pontos para casa. Valeu.
Lances principais.
1º tempo:
Aos 9 minutos, Diego recebeu de Renê e, da intermediária do San José, bateu forte e com perigo, por cima do gol de Lampe.
Aos 20, boa arrancada de Arrascaeta pela meia-direita, a sobra ficou com Gabriel dentro da área. A conclusão saiu forte e torta.
Aos 21, Pará saiu jogando errando, Fernández fez o corte, avançou e chutou da entrada da área. A bola quicou antes de chegar ao gol e Diego Alves fez difícil defesa para escanteio.
Aos 28, Jair Torrico cruzou com perigo, ninguém tocou, Diego Alves saltou sem alcançar e a bola saiu rente à trave esquerda.
Aos 38, boa manobra pela direita entre Hernández e Sanguinetti, envolvendo Renê. O cruzamento de Hernández chegou a Saucedo, que emendou rasteiro. Diego Alves fez ótima defesa.
Aos 39, depois de nova jogada do San José pela direita, Pará tirou mal de cabeça, em direção à entrada da área. Didi Torrico dominou, bateu e Diego Alves fez outra boa defesa.
2º tempo:
Aos 7 minutos, Segovia cruzou da direita, Hernández escorou de cabeça e, da marca do pênalti, Saucedo emendou de canhota. Atirando-se na bola, Rodrigo Caio conseguiu interceptar o chute e salvar.
Aos 11, Jair Torrico livrou-se com facilidade de Diego e bateu cruzado. Diego Alves defendeu firme.
Aos 15, Renê rolou para Diego, Diego para Bruno Henrique e um preciso toque de Bruno Henrique deixou Gabriel cara a cara com Lampe. Gabriel cutucou rasteirinho, no canto esquerdo. Belo gol.
Aos 17, Gomes arriscou da intermediária, com força e efeito. Diego Alves saltou e espalmou para escanteio, em mais uma difícil defesa.
Aos 19, Ramallo recebeu na meia-esquerda, trouxe para dentro e bateu forte, no alto do canto esquerdo. Diego Alves saltou para defender com firmeza.
Aos 23, em contra-ataque iniciado com uma tabela entre Diego e Everton Ribeiro, Diego ligou rápido para Bruno Henrique, que rolou na medida para o complemento de Everton Ribeiro. O chute saiu firme e colocado, no canto direito, Lampe espalmou para escanteio.
Aos 28, Segovia cruzou da direita, Gomes escorou de cabeça, entre a marca do pênalti e a risca da pequena área, e Diego Alves fez mais uma defesaça.
Aos 36, Willian Arão atirou no que viu e acertou no que não viu. Ao dar um balão para afastar o perigo da frente da área rubro-negra, achou Gabriel arrancando livre. Entretanto, para impedir a chegada do zagueiro Toco, Gabriel conduziu a bola para o pé direito, que não é o forte, e acabou concluindo em cima do goleiro.
Ficha do jogo.
San José 0 x 1 Flamengo.
Estádio Jesús Bermúdez (Oruro, Bolívia), 5 de março.
San José: Lampe; Segovia, Rodríguez, Toco e Jair Torrico; Hernández (Gutiérrez), Didi Torrico, Fernández e Ramallo; Sanguinetti (Gomes) e Saucedo (Alessandrini). Técnico: Néstor Clausen.
Flamengo: Diego Alves; Pará, Léo Duarte, Rodrigo Caio e Renê; Cuéllar, Willian Arão e Diego (Ronaldo); Arrascaeta (Everton Ribeiro), Gabriel e Bruno Henrique (Vitinho). Técnico: Abel Braga.
Gol: Gabriel aos 15’ do 2º tempo.
Cartões amarelos: Segovia, Hernández e Alessandrino; Diego Alves, Léo Duarte, Diego e Bruno Henrique.
Trio de arbitragem argentino. Juiz: Néstor Pitana. Bandeirinhas: Diego Bonfa e Maximiliano del Yesso.
Renda e público não divulgados.
Maneiro reler os lances do jogo.
Estava solitário numa mesa de bar em SAN Pedro de Atacama.
Num bar onde havia assistido já há uma partida do Mengo, 3 anos atrás.
Tive que dividir a mesa com um Chileno com um grego, gente de bem, que puderam, ao fim da partida, compreender um pouco mais da grandiosidade do nosso Flamengo.
Legal, Bruno.
Espero que tenha dado pra sacar, na descrição de cada lance, a preocupação em citar todo mundo que participou da jogada, e não apenas o cara que fez o último lançamento e o que botou a bola para dentro.
Abração. SRN. Paz & Amor.
Bom registro, Murtinho. SRN
Valeu, Marcos.
É isso aí, a ideia é essa. Deixar um registro da temporada, de um jeito que a gente não costuma encontrar por aí.
Abração. SRN. Paz & Amor.