O futebol ao vivo é um espetáculo do gênero dramático, nunca sabemos como vai acabar, no que se difere do futebol em videoteipe, que pertence ao gênero épico. Como toda a dramaturgia, é essencialmente um diálogo entre o protagonista e seu antagonista, mediado pelo árbitro e pelo VAR, uma espécie de deus ex machina que às vezes soluciona os impasses da trama encenada e às vezes caga a porra toda.
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A grande peculiaridade dessas encenações futebolísticas, ou ludopédicas, é que o roteiro não está totalmente escrito, cada jogo é uma obra baseada no perfil dos personagens e no seu desempenho no improviso. Cujo final, além de ser sempre incerto, pode também ser definido pela plateia. Plateia que ao contrário do que rolava no teatro trágico grego, é também parte do coro, mantendo-se afastado da ação principal da peça, tendo por função exclusiva comentar os acontecimentos dramáticos.
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Uma maioria expressiva da torcida do Flamengo vai ao jogo, ou o assiste pela TV, sem um roteiro predeterminado, sem uma pauta a cumprir ou uma doutrina a defender. O processo é todo muito natural e orgânico. O torcedor do Flamengo se engalana com as suas vestes rituais, toma seus negocinhos, se conecta com o divino, vê o que acontece em campo e exprime, quando está a fim, as suas opiniões sobre o que está vendo.
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A linha dura da gatomestragem tricontehepta do carioqueta preconiza que pro Flamengo ganhar Brasileiro não pode perder ponto em casa pra ninguém. Muito menos pra paulistada safada, que invariavelmente está sempre embarreirando os naturais movimentos de ascensão do Mais Querido rumo à cúspide da tabela. Errados os gatomestres não estão.
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Ainda assim, os 70 mil bem vestidos que lotaram o Maraca na véspera do feriado de Tiradentes, numa espetacular exibição de livre pensar, ao final da peleja aplaudiram o empate sem gols com o Palmeiras. Causou alguma estranheza nos críticos mais atentos. Assim como a torcida do Flamengo há muitos anos se faz notória por sua generosidade e extrema paciência com times ruins, é também conhecida, em especial a partir de 2019, por manter altíssimos padrões de exigência tática, técnica e artística dos seus craques.
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Em condições normais de temperatura e pressão empatar com o bicampeão continental jogando em casa não seria motivo de desonra pra ninguém. Mas tampouco seria motivo para os intensos aplausos que a Magnética ofereceu aos jogadores e, em especial, ao Paulo Sousa. Céticos disseram “tem parada errada aí, tá muito tranquilo esse morro”. Exagero.
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Ficou demonstrado que a torcida do Flamengo, a quem os simpáticos formadores de caô atribuem controversas qualidades como intolerância e imediatismo, é no mais das vezes justa em seus julgamentos e capaz de enxergar a longo prazo, livre das amarras do resultadismo primitivo que ainda viceja em alguns setores do cornetismo profissional.
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A torcida, no Maracanã ou pela TV, aplaudiu o time e o treinador porque, enfim, conseguiu ver evolução no trabalho. Conseguiu ver consistência em todos os setores do time, conseguiu perceber nos jogadores em campo e até nos que estavam no banco, uma vontade de potência comparável à sua própria. E isso merece aplausos.
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Ainda não dá pra dizer que o Flamengo tem um timaço. E ninguém disse isso porque o Flamengo não só ainda não se mostrou timaço, como também não foi capaz de exercitar o seu proverbial dom de iludir as massas sedentas de glórias e triunfos. Carl Sagan dizia que “afirmações extraordinárias exigem evidências extraordinárias”.
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No contexto do Campeonato Brasileiro 2022 a única evidência extraordinária aceitável é uma goleada impiedosa e humilhante imposta a um rival de valor comparável. Enquanto isso não acontecer a torcida do Flamengo, mesmo com a sua tendência genética ao oba-obismo, não vai sair por aí dizendo que o Flamengo já ganhou. Contudo, enfrentar o número 1 da prateleira e sair do ringue mais inteiro que o adversário é um forte indício que estamos muito na briga pelo Enea. Sinais, fortes sinais.
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Ainda não tem muita gente dizendo que o Flamengo está jogando bem. E muito menos gente dizendo que o Flamengo jogou mal. O que é altamente positivo. Antes de se consagrar filósofo no profissional Nietzsche jogava de filólogo na base e em 1887, dois anos antes de ficar doidão de vez, escreveu um livrinho chamado “Genealogia da Moral, uma Polêmica.”
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Um dos três ensaios do Genealogia explicava em quais condições o homem inventou os juízos de valor expressos nas palavras “bem” e “mal” e que valor possuíam tais juízos. Como era filólogo, pra esse desenrole Nietzsche recorreu à genealogia dos conceitos e à etimologia das palavras. Pro bigodudo alemão, saber o significado das palavras e conhecer a história de sua evolução é a única forma de penetrar na fonte de onde brotam a moral e os valores.
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Para Nietzsche, que era ateu praticante, o conceito de Deixa a Vida Me Levar é sagrado. Aforista desaforado e praticante entusiasta do amor fati (“Não querer nada de diferente do que é, nem no futuro, nem no passado, nem por toda a eternidade. Não só suportar o que é necessário, mas amá-lo”.) meteu serim que “é a vida como impulso, assim mau seria tudo o que é fraco e não consegue ser um afirmador da vida e o bom é o nobre, o guerreiro, que ama a vida enquanto relação de força.” Mas também destacou que “Não existem fenômenos morais, mas apenas uma interpretação moral dos fenômenos” e que “A moralidade é o instinto do rebanho no indivíduo.”
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Portanto, Nietzsche ensinou pros amiguinhos que bem e mal não são conceitos absolutos, sendo perfeitamente possível que fenômenos específicos e intrinsecamente inconclusivos, tais como empates em 0x0, possam ocupar espaços nos campos do bem e do mal simultaneamente. Tudo vai depender da interpretação moral de cada um.
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Aí, do nada, surge aquela imagem desgastadíssima do copo pela metade. Ninguém mais tem saco pra esse papo de copo, diante desse dilema dialético primário o cumpadi Nietzsche pegaria o copo, beberia fosse lá o que o copo contivesse de uma só talagada e providenciaria um refil imediatamente porque sábado tem jogo do Flamengo outra vez. De cara é que não dá mesmo.
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É rumo ao Enea, mas por enquanto é no sapatinho. Filosofia é esporte dos desocupados e ainda não ganhamos porra nenhuma.
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Mengão Sempre
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Nem 8 nem 80 escreve o Fred Gomes.
Concordo.
Mas entao 9, karai.
Odeio ser fregues dos caras do sul. Que coisa irritante é essa de perder e perder la, desde séculos.
Ontem entao foi barra assistir. Depois de ter-mos dado 2 passos timidos adiante, retrocedemos de 4 grandes. Jogamos de novo o futebol do carioca, o que nem serve no Rio menos ainda na casa desses putos do sul.
Se jogadores estao mal, individualmente, é normal. Sao trocados. Se o time inteiro esta mal, ja é inaceitavel – e tem sim uma fonte disso.
O PS testou durante 3 meses coisas. Mas nao testou um conjunto tatico consistente ao qual voltar, quando a barra pesa.
Se os craques nao estao em dia bons – e jogando como deveriam jogar, nas posicoes corretas e ja testadas durante os ultimos 3 anos (!) – o time desaparece e o que aparece é o nao-trabalho do tecnico. Viram 11 individuais tentando se virar do melhor jeito possivel. Ridiculo.
Assistindo entao um Palmeiras x Curintia, a raiva so faz crescer. Que entrosamento! Entra um, toma a funçao conhecida e nada muda.
Parece que nao temos reservas a altura, ou sao mal treinados, ou se integram mal – ou as 3 coisas.
O obvio: Se num campeonato com jogos a cada 3 dias, nao temos um elenco capaz de continuar jogando o MESMO futebol quando um dos titulares sair e sim virarmos bicho … ai vai ser muito dificil atingir o que quer que seja.
Nem contra os pequenos estamos jogando como grandes. Nao adianta jogar relativamente bem contra os grandes (e assim mesmo nao ganhar, convenhamos!) e perder pontos sem fim contra os pequenos.
Estao tentando iludir quem com analises esquisitas?
Porque reaçoes no jogo tao tardias?
Thiago nao jogando nada, ou melhor, sendo um jogador dos outros – pq nao sai na pausa?
Marinho, outro que nao engrena, pq nao sai junto? Porque TIRA-SE do meio pessoal, se estava na cara que era no meio que estavamos perdendo a partida?
Pq se insiste em deixar Joao e Thiago CONSTRUIR o jogo, algo que nao sabem fazer?
Arao é que teria que estar la.
Pq essa saida la de tras, a todo custo, correndo riscos dos piores (Arao !!!)?
Pq Hugo no gol o tempo todo, mesmo mostrando que nao sabe jogar com os pés, nao sabe sair em bolas altas e sempre, em CADA jogo pelo menos uma vez, sai correndo como mula-sem-cabeça atras do vento?
Falta serenidade em muitos jogadores.
Porque? Sem calma, frieza nao se joga bola.
Cade garotos da base entrando em lugar de Léo?
Pq nao tira o Arrasca depois de 50 minutos?
O PS esta mostrando um medo enorme de jogar sem certos jogadores. Assim nao iremos a lugar nenhum. 3 rodadas! 3. E ja estamos com time cansado, jogadores a beira de contusoes e reservas que nao rendem.
Errei. Nao estamos em 9 e sim em 7.
SRN preocupadissimas
Para os que acreditam que o Pardal virou Sabiá até hoje sábado, eskeçam, o cara eh tinhoso na alquimia e maluco no discurso, ou seja, que Jesus nos ajude…
Ps: pra variar, ótimo texto e ainda bem que não o fez hoje Arturela.
Aulas!
Esse texto está tão delicioso , tão bem escrito , tão inspirado , que conseguiu ser melhor que o seu próprio conteúdo que foi algo parecido com um 5×0 no Grêmio em semifinal de Liberta . Meus paraótimos !!
Jogo razoavel, e nao falo do resultado. Somente bom para quem tinha espectativa la em baixo.
Melhorou em todos os setores, indubitavelmente.
Mas estamos longe de ver o que queremos.
Na frente fazem enfim algo as vezes gostoso de ver. As vezes.
E porque acontece isso?
O PS mexeu? Nao, o PS simplesmente voltou ao que a mente sa ja teria feito desde o inicio: Nao mexer naquilo que funciona perfeitamente. Ou melhor, primeiro mexer nos lugares desastrosos (defesa e meio campo pra tras) e somente quando isso estivesse resolvido – talvez – mexer na frente. Talvez.
Bem, nao vou bater palmas para alguem que simplesmente volta ao que é normal.
Temos uma defesa que ainda nao convence.
Mesmo que o idoso estaja -ja sao DOIS jogos !- mostrando enfim um futebol de defensor (por que necessitou esperar 2 anos para isso? suspeito que sei pq) isso nao basta. Nem e longe. Ele continua peça nula no ataque.
Ao lado do David necessita-se um outro zagueiro central, e bom, um beque BOM.
Temos 2 ou 3 contundidos que poderiam entrar. Somente quando estes estiverem tinindo é que vamos ver se o time melhora substancialmente ou nao.
Mas temo que o jovem Hugo nao possa fazer parte do elenco vencedor. Defendeu um boa, verdade. Mas tambem, né, se nao fosse para isso… Bem, continua pessimo com os pés, sai mal pra karai, desta vez ensaiou uma saida louca e foi barrado por um dos nossos, senao teria corrido até o meio-campo pra ver se ganhava a dividida. Assim nao da mais. Em jogo contra a Portuguesa tudo bem, mas nao em jogos de 6 pontos.
O Arao nao esta mal atras, pelo contrario, mas ele é jogador de meio-campo. Em vez do Thiago. Esse nao esta jogando quase nada. Claro que da um desarme legal aqui e acola e de vez em quando um passe maneiro, mas no restante do tempo nao faz nada que preste. Nao, ai o Arao é titular.
O meio campo nao esta ainda encaixado, deixa espaços demais e nao sobe no momento certo e quando desce somente corre pra tras e nao olha para quem esta livre.
Melhorou um pouco do jogo contra o SP para esse, mas falta ainda muito.
Marinho entra e esta perdido. Sera que é cedo? Bem, nao vou esculachar, porque o outro baixim levou quase, nao, mais de um ano pra engrenar.
Quem sabe…
Nao comprendo pq um Pedro nao entra nos ultimos 20 minutos. Nem pq um ANDREAS nao entrou no lugar do Thiago. Teria recebido uma segunda grande chance de espantar o fanstasma da Liberta. E o Thiago estava ruim.
Muito menos entendo que o PS fez somente UMA unica troca. A gente jogando a cada 3 dias, que isso?
Acho que estava com o maior MEDO de mexer errado e a gente perder.
Nao passou nenhuma confiança.
Fora de se arriscar a acabar com os jogadores cedo no campeonato. Nao entendo.
A proxima aquela la no sul que é sempre barra. Vamos ver entao o que o PS faz.
Nao sei ainda se o ano parece ser um dos bons ou nao. Até agora nao vi time melhor que o nosso.
SRN pensativas
P.S. Acho saber porque o idoso lembrou que uma vez jogou futebol: Temos desde pouco tempo uma sombra, e uma grande. Ramon e René nao causavam medo. Essa sombra nova sim. Otimo.
Desde que o Arthur voltou a postar, o time voltou a jogar um bom futebol! Coincidência? Penso que não…
SRN!
Nietzche, Pagodinho & Sagan na ágora flamenga, é pra Moraes sorrir e geral aplaudir, fé no Mengo e pé na tábua!